quinta-feira, 22 de agosto de 2013

Teatro Terra orgulhosamente apresenta (por Diego T. Hahn)

Fico fantasiando às vezes, no caso de a hipótese de não estarmos sozinhos nesse Universo - como pressupõe meu amigo Zé Ramalho - ser verdadeira, marcianos, jupterianos, venusianos, e, enfim, outros ETs da vida, preparando suas pipoquinhas, jogando-se nas suas poltronas nos seus camarotes  em meio às estrelas lá no alto e acompanhando as sessões do pequeno grande teatro do cosmos, que imagino ser o nosso planetinha Terra aqui.
Pois, independentemente do nível de sua inteligência e do seu avanço tecnológico, aposto cinco pila que eles não têm a capacidade de arquitetar as tramas cênicas que nós armamos por estas bandas, meus amigos!!
 Pensei nisso ao ler hoje notícia (chocante) no jornal, sobre massacre de civis na Síria, no qual supostamente se fez uso de gás (sarin, ou algo assim). Bem, não vou me ater especificamente ao conflito em si, até porque na verdade ninguém aqui fora da Síria sabe ao certo o que está rolando lá dentro, quem é quem, quem está matando quem (Governo? Oposição? Rebeldes?) – e talvez, dependendo dos interlocutores que nos passem as notícias, nunca venhamos a saber exatamente... no fim das contas, graças à distância (se não conseguimos fazer algo pelo nosso faroeste tupiniquim aqui, como faremos por eles lá?) e à nossa inércia natural, só podemos melancolicamente mandar nosso repúdio geral à situação e, como “opinião pública internacional” que supostamente somos, pressionar as autoridades globais – ONUs e outras siglas da vida, se é que servem para algo mesmo – para, interesses escusos à parte, agilizar um basta, um cessar-fogo, nesse horrendo conflito, que já se arrasta por mais de dois anos.
Mas o que mais me chamou a atenção – além, claro, do número de mortos e da brutalidade dos ataques – foi a veemente “censura” global ao suposto uso de gás nos ataques.
É óbvio que igualmente não sou a favor do uso de gás em guerras. Faço coro a esse veemente repúdio.
A questão, no entanto - e é uma percepção teoricamente óbvia e da qual quase todo mundo no fundo partilha, mas que "eles" parecem conseguir, com seus jogos de cena, nos confundir e nos fazer esquecer muitas vezes - é que me revoltam, me envergonham, me irritam, me deprimem, as guerras EM SI, não importando suas motivações, suas desculpas, suas armas... Não importando se são usadas granadas, metralhadoras, baionetas, facas, cócegas, gases, bombas atômicas... Portanto, ainda que entendendo e concordando com os princípios desse “veto”, estabelecido há muitos e muitos anos em algumas convenções mundiais, me irrita e me soa como uma hipocrisia tão grande – grande mesmo, em escala global – essa súbita redescoberta daquele conflito graças ao uso de tal arma e esse aparente estupor generalizado com esse artifício que só me reforça a sensação de que somos mesmo umas formiguinhas, que podem ser esmagadas a qualquer momento pela pata do elefante, assim que ele achar que é o momento... fico imaginando os velhotes lá em cima, em volta de uma mesa, bem sérios, com suas jaquetas cheias de divisas e estrelas e o diabo a quatro, argumentando: “ah, isso pode...”, “isso não pode”... “ok”. “Negócio fechado”. Simples assim.
Sou contra o uso de gás. Assim como sou contra o uso da bomba atômica, de napalm, e sou contra o uso da pólvora e das armas brancas e sou contra invadir países, matando seus civis, sob qualquer pretexto, seja o de anexar novos territórios à nação invasora como também exportar-lhes democracia.
Sim, sou um idealista, um sonhador... um trouxa.
E talvez por isso me irrite essa hipocrisia. Explodir tudo com drones pode, metralhar pessoas indefesas pode, cortar cabeças pode, enforcar, mutilar, pode, pode, pode-se fazer o que bem entender nas ditaduras africanas esquecidas no continente perdido, pode-se fazer o que bem se entende na misteriosa Coreia do Norte, pode-se “fazer a festa” nos Iraques e Afeganistões da vida... mas, ah!, não pode usar gás! Pó pará!... aí eu não brinco mais!
Me parece como aquela irritação de um time nos jogos de futebol quando um adversário tenta simular um pênalti. Canalha! Bastardo!! Tentando nos enganar!
Bater à vontade, chutar tornozelo, dar voadora, pode, se o juiz não marcar. Fazer o quê? Tem juiz pra quê, não é mesmo??...
Agora... tentar simular uma falta ou um pênalti... aí é desonestidade! Tentar enganar a “autoridade”!!
Pois não nos iludamos: infelizmente, enquanto existir um ser humano com um desses cérebros com ilimitada criatividade que temos chacoalhando dentro de nossas caixas cranianas vagando dentro de um campo de futebol ou fora dele, ele criará sim coisas belíssimas, marcará fantásticos gols, dará inimagináveis dribles, e talvez ache a cura para o câncer, por exemplo, mas eventualmente ele também tentará cavar um pênalti e, no contexto de uma guerra, lançar um ataque com gás, ou com qualquer outra arma mortífera em grande escala – e provavelmente um dia novamente com A bomba...

Rumo à vitória!

Essa marcha é incontrolável, não nos enganemos: ela se repete desde sempre na história da humanidade e provavelmente assim seguirá sendo, até o fim dos tempos...

O que se devia mesmo, seguindo no raciocínio deste desabafo utópico e provavelmente inútil, era refutar com fúria a idiotice desses conflitos em si, lá no seu início, eliminar no seu nascedouro as razões para eles - que muitas vezes nos são expostas e com as quais, sem nem saber bem por quê, mas graças a mais um truque dos ilusionistas que nos comandam, às vezes acabamos até mesmo concordando - , acabar com a permissividade dominante para que se comecem esses "jogos". Ter em mente que toda guerra é um ataque com gás.
Quanto ao pênalti e as regras do futebol, deixemos isso para os velhinhos da FIFA... quanto ao resto, se houvesse mesmo interesse que se acabasse com os ataques com gás, por exemplo, simplesmente se acabaria primeiramente de inventar guerras estúpidas – e, enfim, toda guerra é estúpida.
O problema é “como acabar com elas?”, se há muito tempo estão enraizados entre nós os fatores que levam às mesmas, como as religiões (apesar da Síria, seguimos normalmente rezando hoje e acreditando que somos abençoados e temos “sorte”), o sistema econômico vigente (apesar da Síria, seguimos normalmente batendo ponto hoje e aumentando o PIB de “nossas” empresas multinacionais e bancos e o diabo), as políticas mundiais (apesar das Sírias...)...
Enfim, essa nossa perfeita organização de sociedade moderna e evoluída e justa e humana e democrática e solidária e...
E os ingênuos marcianos seguem lá em cima, deliciando-se e dando muita risada dessa nossa capacidade cênica.
- Como conseguem?? – pensam eles – Têm mesmo muita criatividade! Grandes roteiros... interpretam tão bem essa seriedade... Ótimos atores!!
E os personagens realmente são tão bem interpretados que, à distância, eles nem se dão conta que talvez se trate tão somente de um daqueles simples teatros de fantoches...
(Diego T. Hahn)

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