segunda-feira, 29 de abril de 2013

No fantástico mundo do supermercado (por Diego T. Hahn)


                                        No fantástico mundo do supermercado

              A incrível jornada começa com você dentro do carrinho, imaginando-se um piloto de fórmula-1 ou um astronauta dentro de uma nave espacial.
A sua mãe vai jogando as compras para dentro e você se diverte fazendo castelos de latas, caixas e pacotes. Conforme as horas vão passando e o carrinho vai se enchendo, a diversão passa a ser mesmo esconder-se debaixo daquela montanha de produtos. Você tem ali seu bunker particular. Ali você fantasia que está a salvo de todos os perigos do mundo.
Dez anos depois, a diversão é assumir o“volante”. Sua mãe vai pegar o carrinho e você se antecipa: “Eu dirijo!”. No início, como o carro ainda está vazio, você ainda consegue arriscar umas manobras ousadas. Obviamente você faz a clássica “corrida de supermercado”, imprimindo velocidade no veículo e então subindo no mesmo, apoiando os pés na barra de ferro que fica sobre as rodas, deixando o carro ir “à toda”, meio desgovernado...
até que algum fiscal do trânsito do lugar o para numa blitz e o notifica: “Isso não é feito para brincar”. A essas alturas, mamãe também já está furiosa com você, pois sumiu com o carrinho dela. De volta à direção defensiva, para alívio dos funcionários e dos outros consumidores, você agora também passa a ter maior dificuldade para guiar, pois o carro vai se enchendo. Assim, diga-se de passagem, como o seu saco...
Mais uns quase dez anos e você só acompanha a coroa no mercado para ir dar uma olhada na seção dos eletrônicos. Como depois de uma meia hora você já viu tudo que tinha para ver lá, enquanto ela normalmente leva umas três horas naquela função, você já se aborrece e começa a se perguntar “mas o que diabos eu vim fazer aqui?”. Enquanto as perguntas ainda se dirigem a si mesmo, tudo bem. Mas quando você, além se ser um inútil e não ajudar a fazer as compras, começa a fazer para a velha a irritante pergunta de criança em viagem – “Falta muito? Falta muito?” - a cada cinco minutos, é mesmo justo que a uma certa altura ela exploda com você, saudosa do tempo no qual você ao menos dirigia o carrinho. E você se arrasta atrás dela, exausto, tendo terríveis crises de hipoglicemia só contornadas após uma passada pela sessão das bolachas, enquanto ela o xinga: “É, pra jogar futebol tu tens fôlego, mas pra me ajudar no mercado não, né?”. Você se arrepende profundamente de ter ido, mas, por algum estranho motivo, um mês depois você estará lá com ela novamente.
Outra década passa e você continuará no mercado com uma mulher ao seu lado: sua mãe ou, mais provavelmente, sua namorada, noiva ou mulher. Possivelmente, se você amadureceu um pouco e não tem mais vontade de pilotar alucinadamente o carrinho, também ao menos contribuirá– se não o fará integralmente – no pagamento das compras e, portanto, passará a ficar mais atento ao que aquela mulher ao seu lado vai jogando para dentro do carro. Agora, ao invés de fazer castelinhos, você vai pegar o produto, olhar a marca, o preço, e tentar identificar até mesmo o que é aquele troço e para que serve...
O seu tempo de paciência não aumentará e nem o dela de permanência lá dentro diminuirá; nada a fazer a respeito, está no dna de ambos.
Provavelmente, você continuará perguntando se falta muito, mas, mais experiente, mais maduro, com outras palavras, tais quais “será que a gente chega em casa a tempo de pegar o início do jogo?”,através de observações como “não sei como ainda anda esse carrinho”, ou então, falando com ar pretensamente distraído para si mesmo, “hummm... Cerveja, comida, papel higiênico... acho que era isso...”.
Depois de meia hora naquela fila que não anda então, você se cansa de uma vez por todas. Você sente o seu instinto gritando lá dentro de você. Você olha para os dois lados. Você olha para ela. Ela olha para você. Você sorri, pisca para ela, que não entende muito bem o que está acontecendo, e você então sai correndo com o carrinho pelo corredor, dá aquelas“pedaladas”, sobe na barra de ferro sobre as rodas, joga a cabeça e os braços para trás gritando “uhuuuuuuuuuu!!” e sente aquela brisa de liberdade batendo no peito...
Ela, incrédula, vai atrás, pega você pelo braço e o traz junto com o carrinho, xingando-o baixinho, roxa de vergonha...“Eu não acredito nisso!... O que te deu? Você enlouqueceu???”
Ao chegar na fila novamente, enquanto todo o supermercado olha para você, você vira a cabeça e olha triste para o corredor. Aquele longo corredor ali todo para você...
e você ali, naquela fila... Enquanto a mulher continua esbravejando e xingando-o e todas as pessoas ao redor ainda observando-o com um misto de curiosidade e espanto, você olha desolado e aborrecido para dentro do carrinho abarrotado de compras e naquele momento tem vontade então de voltar lá para dentro - para a segurança das profundezas do seu velho abrigo subterrâneo.
 
(publicado em "Flashbacks de um mentiroso")

Frase da semana (por Charles Bukowski)


“É este o problema com a bebida, pensei, enquanto me servia dum copo: se acontece algo de mau, bebe-se para esquecer; se acontece algo de bom,bebe-se para celebrar; e se nada acontece, bebe-se para que aconteça qualquer coisa.”

sábado, 27 de abril de 2013

Feira do Livro de Santa Maria

Pois está começando hoje, sábado, 27 de abril, a Feira do Livro de Santa Maria, edição 2013, na praça Saldanha Marinho.

  Alguns destaques da programação do evento, além das 117 sessões de lançamentos e autógrafos:

- Lançamento de 2 DVDs do projeto "Por onde passa a memória da cidade", da TV OVO, que relata 50 histórias de pessoas em sete localidades diferentes da cidade;

- Show "Santa Maria que sorri", de grupo de músicos da cidade que gravou recentemente clipe da canção hino informal da cidade, "Santa Maria", de Beto Pires;

- Entrevista/bate-papo com Humberto "Engenheiro do Hawai" Gessinger, que além das belas canções da banda tem também alguns livros no currículo, sendo o último "Nas entrelinhas do horizonte", de 2012;

- Marcam presença também na Feira a jornalista Sonia Bridi, o cartunista Latuff, o escritor Fabricio Carpinejar, entre outros...


Além, é claro, do grande "protagonista" dessa bela história toda: o velho e bom livro! - nos mais diversos estandes e com os tradicionais descontinhos amigos do evento (inclusive o "Flashbacks de um mentiroso", que estará à disposição nas bancas da Casa do Poeta de SM, da Cesma, da Athena Livraria, e da Ufsm!)...

Boa Feira pra gente!!

quarta-feira, 24 de abril de 2013

Pelos sebos da vida: "Os duelistas", de Joseph Conrad (por Diego T. Hahn)


Esta obra, na versão pocket, foi achada no Sebo Café (exploraremos melhor o local em um próximo tópico) da Floriano aqui em Santa Maria, por módicos 10 reais. Atenção; creio que aqui se faz necessário advertir a possibilidade de spoiler neste relato ("Spoiler: ato fdp de entregar o ouro, contando partes importantes ou até mesmo o final de filme ou livro")...

 
Bem, Os duelistas é um romance do escritor britânico de origem polaca Joseph Conrad, que conta a história de um interminável duelo – o título original é “The duel” – entre dois oficiais do exército de Napoleão. São dois opostos que "se atraem": o fanfarrão Féraud e o reflexivo D´Hubert.
 
Os duelos são proibidos entre os soldados do exército francês, o que faz com que os encontros da dupla aconteçam em meio a uma certa clandestinidade e a disputa acabe por ganhar ares legendários, especialmente pelo fato de ninguém além dos dois saber ao certo o verdadeiro motivo da contenda. E assim os protagonistas vão se enfrentando em diversos duelos que acabam invariavelmente inconclusos através dos anos e em diferentes partes da Europa em meio às guerras napoleônicas. Resta a metáfora em relação aos absurdos da guerra como um todo e, de certo modo, no fim das contas, os dois que acabam por depararem-se com os desdobramentos do duelo, além do próprio duelo, no destino de suas vidas.
 
Teve uma versão hollywoodiana naquela que foi a estreia de Ridley Scott como diretor cinematográfico. No entanto - apesar do bom Harvey Keitel no elenco - , pelo que dizem, o diretor, ainda verde, não tinha as devidas experiência e inspiração (inspiração essa que viria nos dois títulos seguintes que dirigiu e suas obras-primas, Blade Runner e Alien) e talvez seja melhor ficar mesmo com essa bela trama de Conrad no papel.

(por Diego T. Hahn)

segunda-feira, 22 de abril de 2013

sábado, 20 de abril de 2013

A personalidade das máquinas (por Juliano Lanius)


                                            A personalidade das máquinas

              Até que ponto desta desenfreada evolução tecnológica a máquina será capaz de ultrapassar o ser humano na execução de tarefas que antes só eram realizadas pela raça humana?
            Assim como o comprimento – assim mesmo – da pergunta, a questão sugere uma abordagem extensa do quão importante é o homem em sua própria evolução. Possuímos um dom muito gracioso, de evoluir a nós mesmos. A modernidade vem a calhar quando o assunto é a comodidade dos serviços oferecidos. Inventamos aparelhos ultramodernos, no intuito de servir a nós mesmos. E isso não é ruim, se pensarmos pela ótica de quem trabalha para proporcionar alguns prazeres a si próprio, quando julgamos o momento certo. Leiam a seguir a narrativa que elucida todas estas palavras supracitadas.
            Por questões de força maior, resolvi entrar em contato com minha operadora de TV a cabo. Gostaria de saber a maneira de regularizar um boleto pendente de pagamento. Ao chegar em casa e ligar a televisão, notei que havia um ícone, no canto da tela, me informando sobre uma mensagem recebida. Pela televisão? Sim, e informando-me sobre o devido atraso no pagamento da fatura. Neste aviso, havia o telefone de contato para a regularização do débito. Liguei.
            Fui atendido por uma voz muito simpática. Sedutora, diria até. Mas era um homem, então o encantamento durou pouco. A princípio, confirmou meus dados e reviu meu histórico como cliente. Eu nem sabia que possuía um histórico. Sujei meu histórico na empresa, atrasei uma conta. Talvez meu nome não seja incluído na lista dos clientes mais benquistos e com chances de ganhar em alguma promoção. Entre um aviso e outro sobre todos – eu disse todos – os procedimentos que realizaria a seguir, ouvia-se sons de teclado sendo digitado. Não me perguntem se eram dedos de verdade, pois eu não os vi. Então, questionou-me se o assunto que eu gostaria de tratar era o tal boleto pendente. Ao confirmar, escutei um “pois é”. Como assim “pois é”? Máquinas não falam “pois é” depois de uma afirmação. Seria um equipamento eletrônico capaz de dividir nossas aflições? Aquele “pois é” me soou como: “eu entendo que os tempos não estão fáceis para ninguém, mas, infelizmente, é o meu trabalho lhe cobrar, então só peço que o senhor seja compreensivo”. Nunca tinha ouvido nenhuma máquina dizer “pois é”. Será que era uma máquina mesmo?
Não sei.  Esse “pois é” foi tão sincero, tão afetivo e tão pessoal, que fiquei imaginando que devo ser conhecido no setor de cobrança da operadora como aquele que está sentindo os efeitos da crise econômica e não tem nem cinquenta reais para pagar uma prestação de TV a cabo.
            A próxima pergunta foi se eu tinha a intenção de regularizar o débito. E eu tinha. Confirmei. Tecla 1. Fui avisado que o meu desejo seria gravado no sistema. Novos sons de teclado. A conversa foi finalizada com a informação de que uma segunda via do boleto estava disponível no site da empresa. À minha disposição. À hora que eu quisesse. Mas a melhor vem agora. Vejam as últimas palavras da máquina de voz sexy, depois que confirmei que não queria mais nada, além do boleto: “– Muito bem, se este é o único assunto do qual o senhor gostaria de tratar, muito obrigado. Até logo”. E desligou na minha cara! Poxa, só porque eu atrasei a conta não significa que eu não mereça um mero: “Senhor, gostaríamos de lhe oferecer uma promoção relâmpago imperdível!” Não, simplesmente desligou, com lucidez, caráter e profissionalismo. A empresa se superou no quesito eficácia. A máquina – ou a pessoa – me levou direto e sem rodeios ao meu objetivo. Incrível.
            Estamos em uma fase em que nos apegamos mais aos meios que nos levam a conhecer pessoas do que às próprias pessoas. Os apertos de mão não são mais aplicados, e sim viraram aplicativos. Mas, de repente, é tudo uma fase ruim. Quem sabe, um dia voltamos à era em que abraçávamos nossos pais em praça pública e gritávamos eu te amo aos quatro ventos. Quem dera conhecêssemos tão bem aos outros e a nós mesmos. Mas, um dia, chegamos lá.
            Que as máquinas encurtem as distâncias dos que estão afastados. E que os que estão próximos não se deixem afastar por elas. Quem dera conseguíssemos. Valeria muito a pena.


(Juliano Lanius)

terça-feira, 16 de abril de 2013

Heróis (por Diego T. Hahn)


                                          Heróis
Sérgio e Diogo eram ex-colegas de colégio e amigos de infância. Reencontraram-se pela rua depois de anos sem se ver e Sérgio convidou Diogo para ir tomar uma cervejinha à noite com sua namorada Laura e a amiga dela, Clarissa. Diogo topou.
- Pois como eu ia te dizendo, Cla... o Diogo aí é uma espécie de herói... – dizia Sérgio, apontando para o amigo e rindo já meio embriagado. A ideia era empurrar Clarissa para Diogo. Diogo passava viajando, fazia tempo que não tinha uma namorada fixa... era hora de dar um jeito naquilo. Fazer o cara se “assentar” um pouco... Diogo andava pensando mesmo em ficar um tempo pela cidade. E Clarissa, na casa dos seus trinta e poucos, andava desesperada. Então, feitos um para o outro...
- Que é isso... – ria de volta Diogo.
- Esse cara... esse cara!... ele estava sabe onde antes de aparecer do nada esta tarde?
Onde? Onde? Perguntava Clarissa com o olhar, curiosa.
- Onde você estava mesmo, cara? – gargalhava Sérgio, confessando sua embriaguez.
- No Afeganistão... – sorria meio sem jeito agora Diogo.
- É mesmo? – interessava-se Clarissa – fazendo o quê?
Sérgio interrompia:
- Ele não gosta de falar disso... como todo bom herói... he he he... mas deixa que eu conto pra você: ele estava lá trabalhando com a Cruz Vermelha... ajudando feridos e desabrigados, vítimas do regime talibã...
Laura tentava traduzir para Clarissa, já que esta não era exatamente, digamos, a mulher mais antenada do mundo a respeito de determinados assuntos:
- O Diogo ajuda pessoas nessas zonas de conflito pelo planeta afora...
- Puxa... – impressionava-se sinceramente Clarissa, controlando-se, porém, para não perguntar como funcionava aquele tal regime talibã, se era parecido com o de melão e aveia duas vezes ao dia, que ela seguia fielmente há seis meses.
Diogo, que tinha gostado de Clarissa – apesar do complexo que ela tinha com os seios pequenos, era uma mulher bonita de rosto e de corpo - , tentava mudar de assunto, falar de futebol, cinema, mas Sérgio e Laura não deixavam...
- Calma... e antes disso, sabe onde ele estava? – continuava Sérgio.
Onde? Onde? Perguntava Clarissa com o olhar. 
- No Iraque... ajudando também outros feridos e desabrigados... esses, vítimas da “missão de paz” dos States lá... – respondia Laura, toda orgulhosa do amigo.
- Puxa... – repetia Clarissa.
- É... – respondia meio tímido Diogo.
- Deve ter sido legal... – concluía a menina – digo, uma bela experiência...
-Bem... eu não diria propriamente bela... mas... sim...
- Não, sim!... assim... quero dizer... né!?... como experiência...
- Calma lá, minha filha! – interrompia mais uma vez Sérgio – por um acaso você sabe onde ele estava antes disso? Você sabe?
Não. Ela não sabia.
- Ele estava no Polo Norte, num daqueles navios da galera ecológica e tal, lutando contra os baleeiros japoneses... como é mesmo o nome da organização, Diogão?...
- Greenpeace.
- É isso aí... Greenpeace... tá ligada? O cara aqui é um heroi... – afirmava Sérgio, dando um tremendo tapa nas costas de Diogão, que só sorria cabisbaixo, repetindo “pois é... pois é...”.
- Nossa... – surpreendia-se Clarissa. Ela já tinha ouvido falar alguma vez no nome daquela organização. Mas imaginava que fosse uma rede de design ou algo assim – afinal... green... é verde, né?... sabe como é... cores... enfim... – de qualquer maneira, embora não soubesse muito o que dizer a respeito – pensou em perguntar a respeito do tamanho dos seios das mulheres no Iraque e no Polo Norte, mas desistiu – já parecia interessadíssima em Diogo.
- Você me dá uma carona depois, Diogo? – perguntava ela inocentemente com sua voz melosa – é que o Sérgio e a Laura moram lá pro outro lado...
- Claro, claro... digo, eu não estou de carro... mas sem problemas, podemos ir juntos; te dou uma carona de táxi – disse Diogo, sorrindo.
-Ah... ok... – respondeu a moça.
Nesse momento, estaciona em frente ao bar uma BMW preta reluzente. De dentro dela sai Ricardo. O doutor Ricardo.
- Ó o Ricardão aí! – gritava Sérgio. Sérgio não lembrava, mas havia convidado Ricardo para tomar uma cervejinha com eles também. Mais tarde, Laura cobraria isso de Sérgio: “Pô, mas logo o Ricardo, Sérgio!? ”.
- Desculpem o atraso... desculpem o atraso... é que estava numa cirurgia...
- Ôpa... cirurgia do quê, Ricardão? E contra quem?... – perguntava rindo seu riso bêbado Sérgio.
- Implante. Silicone. Na dona Márcia. Foi tudo bem.
- Ôpa! Um brinde então aos seios novos da dona Márcia! – levantava-se Sérgio, erguendo o copo.
- Um brinde aos seios novos da dona Márcia! – repetiam os outros.
- Puxa... – impressionava-se Clarissa – você é cirurgião plástico??
- Sim, sim... – respondia o doutor Ricardo.
- Mas... tão jovem... nem parece... digo... entende?...
- Pois é... pois é... – respondia sorrindo balançando a cabeça o doutor Ricardo.
- E quantos miligramas foram nessa cirurgia? Quanto tempo de recuperação? Puxa, deve ser muita responsabilidade, né!?... – os olhos de Clarissa efetivamente brilhavam então.
Depois de mais algumas cervejas que fizeram os olhos de todos os outros presentes brilharem muito também, pagam a conta e saem do bar. Enquanto Sérgio e Laura deslocam-se para o carro deles – Laura brigando com ele baixinho pelo seu estado etílico e ainda por ter convidado Ricardo -, Clarissa vira-se para Diogo:
- Diogo, foi um prazer... olha, eu acho que vou fazer o seguinte: vou pegar uma carona com o Ricardo... já que ele mora pro mesmo lado que eu... não quero te atrapalhar, te fazer gastar mais ainda no táxi só pra me levar, ok?...
- Bem, ok... – sem em segundo algum deixar transparecer o ligeiro desapontamento que no fundo o toca com o desfecho da noite aparentemente diverso do que imaginava, responde Diogo, do alto de toda sua "heroica" classe – igualmente, Clarissa... foi um prazer...
Diogo e Clarissa então se despedem e nunca mais se veem.
 Ricardo leva Clarissa para a sua casa aquela noite. Alguns dias depois estão namorando. Juntos, são felizes por dois meses... até que Ricardo troca Clarissa por uma enfermeira chamada Elisângela.
Clarissa continua então desesperada – e com o mesmo complexo de seios pequenos de sempre...
Sérgio acordou de ressaca no dia seguinte. Laura continuou xingando-o – o que só aumentou sua dor de cabeça...
Diogo passou mais alguns dias na cidade, saiu e se divertiu mais algumas vezes, mas logo partiu de novo...
Na última vez que se ouviu falar dele estava no deserto de Darfur, no Sudão.
Ele continua tentando salvar o mundo.


(Diego T. Hahn/ publicado em "Flashbacks de um mentiroso")
 

segunda-feira, 15 de abril de 2013

Frase da semana (por George Bernard Shaw)



Quando resolvemos um problema, criamos outros dez.” 
 
(Nota da redação: a escolha de tal sentença para estrear a sessão “Frase da semana” veio após a edição de um pequeno detalhe no conteúdo do blog – a correção de uma única palavra com a inserção de uma simples crase! –  ter gerado, com esse mesmo clique no "salvar", por efeito dominó – por um desses motivos que fogem à razão do ser humano comum – a desconfiguração de uma dúzia de outras impostações – tais quais formato de página, cores, tamanho de fonte, data, língua, etc – que estavam em perfeita ordem até então... do que pode-se inferir que não só o tal “ser humano comum” como também um gênio, como Bernard Shaw, talvez tivesse problemas vez em quando com seu blog!)
 

quinta-feira, 11 de abril de 2013

Domingos em Porto Alegre (por Juliano Lanius)


DOMINGOS EM PORTO ALEGRE

            Seu Domingos é moço ainda. Com esse modismo de longevidade, podemos dizer que Seu Domingos é um jovem de vinte e quatro – não que ele tenha vinte e quatro anos, mas ele nasceu em 1924. Morador de Porto Alegre, é grande apreciador do Rio Grande do Sul. Seu Domingos tem muito orgulho da cidade onde vive e conhece como ninguém a história do lugar, os sítios históricos e os monumentos que fazem parte da cidade de Porto Alegre. De tão entendedor sobre os percursos da vida desta grande metrópole, Seu Domingos, certa feita, foi convidado a contar um pouco da história da cidade para alunos universitários.  Isso serviria para que eles tivessem um contato mais direto com alguém pertencente ao lugar. Os alunos tinham a cidade de Porto Alegre como objeto de estudo. Eis alguns trechos de seu relato aos alunos, um momento em que Seu Domingos se deixou levar pela emoção, dando aos alunos a certeza de ser um eterno apaixonado pelo solo rio-grandense, especialmente Porto Alegre. 
- Boa noite. Meu nome é Domingos, sou natural de Porto Alegre, onde me criei e vivo até hoje. Essa cidade me traz lembranças muito boas. Foi aqui que meus filhos e meus netos frequentaram a escola, desde a primeira série. Infelizmente, na minha época, o estudo não era uma prioridade nas famílias do interior. Eu não lembro muito bem, mas minha mãe –  que Deus a tenha – dizia que eu era um rapaz que gostava de ler. Como as coisas mudam, não é? Naquele tempo eu conseguia, pelo menos, enxergar as letras. Hoje, eu mal consigo ler o que diz no letreiro do ônibus. Esses dias, além de ter embarcado no ônibus Cerrito, ao invés de Centro, tive que ficar de pé no ônibus, a viagem toda – era dia de pagamento do INPS. Mas isso nada tem a ver com nosso assunto principal: o Rio Grande do Sul. Mais precisamente, Porto Alegre. Cidade bonita. Vamos começar pelos locais de ensino. Os colégios. As escolas fazem parte da história de qualquer cidade. O ensino está presente em todos os momentos da evolução. Quero dizer, na minha época pensávamos assim. Hoje em dia, não sei não. O meu neto está na fase adolescente, catorze anos, e é um dos que não concordam com essa idéia. Ele disse que deu seu primeiro beijo. Na escola.
“E escola é lugar de fazer isso, moleque?” “Bah, coroa, ela tava afim e eu grudei”. ”Coroa? Eu lá sou moeda para tu ficares me chamando de coroa? E por acaso virastes cola para ficar grudando nos outros?”. Ele me contou que a menina era, digamos, desprovida de qualidades anatômicas favoráveis. O legítimo bagulho.
Mas ele disse que estava precisando se especializar no negócio de beijar, afinal de contas ele já tinha 16 anos e ainda era BV. “Que troço é esse de BV?” “É boca virgem Vô.Todo mundo sabe”. Todos os seus colegas já tinham dado pelo menos um beijo na boca, e ele ali, literalmente chupando dedo. E não só o dedo como a mão toda, pois um amigo lhe disse que tinha que treinar na mão primeiro, para não passar vergonha na frente da guria, babar, morder, ou algo do tipo. Bem que eu notei que ele estava com alguns roxos na mão e com a boca seca. Até perguntei: “Tu ta fumando aqueles capim com cheiro de palha mofada pegando fogo depois da chuva, guri?”. E não estava realmente. Ficava horas em casa, chupando a mão. Isso lhe rendeu marcas semi-definitivas. Mas o bonito mesmo foi o lugar que ele deu seu primeiro beijo. Museu de Tecnologia da PUCRS.
É um lugar de visitação. Geralmente de estudantes. Sendo que, neste dia, em que meu neto perdera o cabaço da boca, o colégio em que ele estuda estava fazendo uma visita pelo local. Ele me falou que queria que tivesse um clima quando tudo acontecesse. O rapaz puxou ao avô, um eterno romântico.  Aí levou a menina até uma parte do museu, onde ficam os animais empalhados. Ao perguntar se eram animais raros ou pássaros exóticos, me respondeu que não. Disse que gostava de valorizar as coisas daqui, então foi ao habitat do ratão-do-banhado, da chinchila, da garça e do tatu-bola. Um cenário muito tranquilo, acolhedor. “Até que o beijo foi bom, mas quase perdi um dente”. Acho que o garoto estava um tanto ansioso, afoito, sei lá. 
 
“- Aí, mais tarde, no meio das minhas andanças, descobri outro local bom de dar uma volta ou matar aula, a Praça da Alfândega”. Vocês acreditam que meu neto me falou isso? Assim. Na lata, como dizem os jovens. Na lata. Entorpecido com sua audácia, resolvi conferir se o que dizia era verdade. Peguei o moleque no flagra, “gaseando” aula – só os gaúchos conhecem esta expressão. Na Praça da Alfândega. Deflagrando o local que serviu de palco para momentos importantes desta cidade querida chamada Porto Alegre. Quase que fiz meu neto perder a audição, tamanho foram os puxões de orelha que dei nele. Na minha época funcionava. Sabem aqueles “espichadores” que os jovens colocam na orelha? Aqueles que ficam um buraco que pode servir de tipóia em um acidente? Eu estava tentando fazer um artesanal em meu neto. A despeito destas frustrações, a Praça da Alfândega é muito bonita, arborizada. “E tem uns esconderijos ‘da hora’ para dar uns beijinhos nas meninas que só vendo”. Palavras do neto do vovô. A Praça da Alfândega tem muitas histórias a contar. Nossa, e como tem.  
- Mas vamos seguir o baile, tchê. Outro local bastante importante na história de Porto Alegre, e da minha também, é o Centro Histórico da Praça da Matriz. Nos arredores desta praça é que se localizavam os prédios dos poderes executivo, legislativo e judiciário. Até me lembro de uma vez que tive que ir ao judiciário falar com o juiz, pois a mulher do meu filho decidiu que queria uma pensão depois que se separaram. Falei com o juiz, ele não tinha condições de dar nada a ela. Mas, não houve jeito. Aquela desgraçada levou quase tudo o que o coitado tinha. Só sobraram as bombachas e as alpargatas. Não me segurei e a mandei aquela lorpa botar um serviço naquele corpo gordo. Não entendo como meu filho foi gostar dessa jararaca.  
- Mas, vamos voltar ao que interessa. Perto da Praça da Matriz se encontram também o Palácio Piratini, a Catedral Metropolitana e outros prédios mais. Na frente da Praça da Matriz também se encontra o Theatro São Pedro, um dos maiores do estado. O Theatro já foi palco de peças importantes, e por ali passaram inúmeros artistas. O porto-alegrense, como todo gaúcho, gosta de um teatro viu, tchê. Mulher, então, nem se fala. A minha “veia”, por exemplo. Esses dias, só por que eu cheguei um pouquinho mais tarde em casa, levemente embriagado, fez uma cena dramática. Merecedora de um Oscar. E quando tem perfume diferente, então? Nossa, aí parece teatro para surdo de tanto que a mulher grita, grita e grita. Toda mulher tem um pouco de atriz por dentro.
- Porto Alegre tem uma vida cultural muito intensa, com várias casas de espetáculos e shows. Outras formas de manifestação popular podem ser vistas em Porto Alegre, como é o caso do Brique da Redenção.
 
 Lá podemos encontrar artesãos, músicos, artistas de rua e muitos outros movimentos populares. Eu não deixo de ir todos os domingos ao Brique, nem que seja pra tomar um chimarrão e passear com meu cachorro. Mas eu levo a sacolinha e junto as cacarias do meu cachorro. O triste é querer sentar na grama para descansar um pouco e não poder levantar mais até que o brique esteja vazio. Sim, por que, se levantar antes, todo mundo vai ver que tu estás levando algo pertencente a outro animal. Não é fácil, viu? 
- Bom gente, agora que vocês conhecem um pouco mais da minha cidade, espero que vocês venham visitá-la. Quando vierem, me avisem, assim a gente pode ir juntos aos lugares de que falamos. Não se esqueçam de trazer o chimarrão, por que ninguém é bobo de ficar pagando erva para vocês. E se vierem com cachorro, a sacolinha à tira cola, viu? Bueno, um abraço para os guris e um beijo para as gurias. Ah, e, gurias, se vocês quiserem, eu mostro para vocês os esconderijos da Praça da Alfândega.   
                                                                                                                                       (Juliano Lanius)
 

quarta-feira, 10 de abril de 2013

Apresentação do "De Letra"

Salve, salve, pessoal!  
Aqui vai uma breve descrição do nosso blog:
Basicamente, este espaço surge do intuito de se proporcionar uma nova alternativa para informalmente nos divertirmos debatendo e trocando ideias sobre literatura em geral, seja aquela que andamos lendo e curtindo por aí como a que andamos nós mesmos produzindo, procurando assim disponibilizar este espaço também para a divulgação de projetos, obras e textos próprios e de amigos, conhecidos, e quem mais goste de se aventurar no ramo e queira partilhar sua poesia, sua prosa ou mesmo qualquer outro delírio literário que eventualmente não viesse a se encaixar em categoria alguma - e que talvez estivesse fadado a mofar em alguma gaveta (ou alguma obscura pasta de arquivos na área de trabalho de algum pc) para todo o sempre, privando maldosamente assim o mundo de toda sua genialidade...
Aqui são todos bem-vindos: aqui são todos grandes críticos literários; aqui são todos ilustres Jabutis e Nobéis; aqui, pelo simples fato de amarem e/ou se aventurarem com as letras, são todos grandes craques da nossa literatura!! 
 
Bem-vindos ao De Letra!!
(Diego T. Hahn e Juliano Lanius)