domingo, 30 de junho de 2013

Frase(s) da(s) última(s) semana(s) (por Povo Brasileiro)


No ritmo da primavera brazuca, para o De Letra não permanecer alheio aos últimos acontecimentos pelo país e ao mesmo tempo para também não corrermos o risco de soarmos repetitivos nos estendendo em teorias e análises, já que aparentemente quase tudo a respeito já foi dito e redito, escrito e reescrito à exaustão nos últimos dias, decidimos simplesmente elencar aqui algumas das melhores frases colhidas em cartazes – afinal, poder-se-ia dizer que também se trata de uma forma de literatura – exibidos nas últimas manifestações nação tupiniquim afora:

“Não queremos partidos, queremos inteiros.”

“Já temos estádios de primeiro mundo, só falta construir um país em volta!”

“Estamos atrapalhando a Copa? Desculpem a falta de educação!”

“País desenvolvido não é onde pobre tem carro, é onde rico usa transporte público.”

“Enfia os R$ 0,20 no SUS!”

“Seu guarda, seja meu amigo...”

“Odeio bala de borracha, joga um halls!”

“Por apenas R$ 0,20 compramos a volta do debate político no Brasil. Tá barato!”
 
 
 

segunda-feira, 24 de junho de 2013

Depilação com luz pulsada (por Juliano Lanius)


Depilação com luz pulsada

            Dia desses, tive a confirmação de que os relacionamentos entre amigos homens e amigas mulheres são totalmente diferentes. Ainda bem. Enquanto homens preferem não conversar diante de uma partida de futebol, mulheres trocam informações sobre os cabeleireiros.
            Na realidade, até o tratamento entre gêneros é distinto. O do homem é escandaloso, mas sincero. O das mulheres, animado, mas dissimulado. Dois amigos, quando se encontram, depois de algum tempo sem se ver, cumprimentam-se: “E aí, seu maricas! Como vão as coisas? Seu filho da p*, quanto tempo! Vê se aparece mais vezes, fedorento!” Depois, comenta com os outros amigos: “Considero este cara como se fosse meu irmão.” Já as mulheres: “Oi amiga, tudo bem? Que lindo ficou teu cabelo com essas mechas. Onde tu compraste teu esmalte? Que cor linda! Bolsa nova? Tá podendo, hein!” Em outro momento: “Que perua! A bota não estava combinando com o cinto. E o decote? Até parece que aqueles dois são de verdade. Duvido!”
            Porém, as mulheres conseguem manter mais a proximidade afetiva em sua relação com as amigas do que os homens com os amigos. Se beijam e se abraçam longamente. Conversam de mãos dadas, sentadas no sofá. Não fecham a boca um minuto sequer. Muitas vezes, se torna ininteligível o que conversam. Mesmo para amigos modernos e cabeças-abertas como eu e meu amigo, Mário. Presenciamos a conversa entre nossas respectivas companheiras, que são amigas de confissão. Sabem aquelas que conhecem tudo uma da vida da outra? Dessas. Será que as namoradas, esposas, noivas, concubinas, ou seja lá o que for, não percebem que denigrem a privacidade do homem quando revelam a vida dos dois à um terceiro? No caso, uma terceira. Os homens se mantêm mais conservadores no quesito intimidade. Não estamos acostumados a ver o estilo capilar das partes íntimas do outro. Se é “Hitler Style” ou “peruca de palhaço”. Nem mesmo gostamos do fato de emprestarmos nossas roupas à outra pessoa.
            Bem, voltando ao teor da conversa entre minha mulher e a de Mário, o fato é que elas estavam tagarelando sobre uma nova técnica de depilação. Imaginem a cena. Duas mulheres e dois homens em uma sala. Futebol na TV. E depilação nas gurias. Não combina, não é? Pelo menos, o papo serviu para plantar a semente da idéia de que Mário poderia se submeter a tal “depilação com luz pulsada”. Não sabíamos, até então, que Mário é conhecido na corporação – ele é policial – como primo Itt. Parece-me que ele até vai participar de uma campanha de arrecadação de pêlos para a confecção de perucas em prol da Associação dos Carecas do Nordeste. Vai receber, inclusive, medalha de honra ao mérito.
            Engraçadas também são as diferenças de diálogo entre os casais. Enquanto o homem pede a ajuda da mulher para relembrar os fatos dos quais já não se recorda, a mulher reclama que as dietas do marido não duram mais de três dias. Mas, como diz minha mulher, cada casal se entende do seu jeito. Cada amigo sabe do outro. Cada relacionamento é único e inconfundível. Por isso, continuamos juntos. Todos nós.
 
(Juliano Lanius)

segunda-feira, 17 de junho de 2013

Pelos sebos da vida: "O amor nos tempos do cólera", de Gabriel Garcia Marquez (por Diego T. Hahn)


Em ocasião do Dia dos Namorados passado há alguns dias, aqui vai este texto sobre um dos maiores clássicos de Gabriel Garcia Marquez...
Bem... cara, não é que eu seja um sujeito insensível nem nada assim, mas, ultimamente quando vejo a palavra “amor” no meio do título de um filme ou livro, costumo fingir que nem vi e passar reto... sei lá, isso provavelmente por me remeter à profusão de “mela-cueca”, “água com açúcar” e comédias românticas, enfim, todos esses enlatados holywoodianos meio parecidos – e às vezes muito forçados – dos últimos tempos (lembro sempre de ter ido certa vez ao cinema assistir “Cidade dos anjos” e acompanhar atônito  aquela choradeira de boa parte da plateia no final do filme... Eca! – esse já não é tão novo, é verdade, mas é um bom exemplo de filme romântico que fez sucesso e eu achei um grude melequento dos infernos e deve ter ajudado mesmo a me “traumatizar"... me vem até de dizer que Cidade dos anjos, o c*, filmaço romântico de fazer chorar é Cidade de Deus, p*!!)...
Pois, bom, para provar que não tenho um coração de gelo e sou, sim, também um romântico, digo aqui que gosto bastante, só para exemplificar alguns, dos filmes “Em algum lugar do passado” (com seu paradoxo do relógio que faz o pessoal da geração mela-cueca virar mela-cuca por quase fundir a mesma ao se indagar, “mas como é possível...”, mostrando que são românticos de meia tigela, afinal o ponto-chave da história, o verdadeiro romance dela – e, por que não?, da vida em geral – está exatamente aí, no paradoxo, no impossível... ahá! Essa ficou boa), “Antes do amanhecer” (com seus diálogos bacanas e não aquele festival indiscriminado de “eu te amo!” e “você me completa!”), “Brilho eterno de uma mente sem lembranças” (não se deixe levar pelo preconceito contra o Jim Carrey; embora ele esteja bem e não comprometa neste, de qualquer forma a Kate “Titanic” Winslet não deixa a peteca do filme cair – o que seria difícil de qualquer maneira, devido à ótima trama, ganhadora inclusive de Oscar de roteiro original), e “Cinema Paradiso”, que já vi e revi e provavelmente vou rever ainda, por estar mesmo no meu top 10 (e isso numa classificação “geral”, e não só entre filmes românticos)...
Bom, mas, enfim, feita aqui a minha defesa, não era sobre isso que queria falar exatamente. Ao menos não sobre filmes (embora vá mencionar ainda mais um na sequência). Mas sim sobre um livro, que tem o tal “amor” no título também, mas, felizmente, está longe de ser um mela cueca ou um água com açúcar... não, esse sim é que é um romance romântico de verdade, meus amigos!
A partir de agora, cuidado, há a possibilidade/ probabilidade de spoiler no lance (spoiler, sempre dando o toque pra quem não sabe, é o ato fdp de “entregar o ouro”, contando partes importantes e/ou até mesmo o final de filme ou livro).
 
Neste romance do mestre colombiano (que, infelizmente, como revelou seu irmão recentemente, está perdendo a memória e a lucidez, devido à demência senil), no qual não há, diga-se de passagem, nenhum Buendía perdido pelo caminho, o protagonista é Florentino Ariza, que desde garoto é apaixonado pela bela Fermina Daza e com a qual se corresponde através de cartas na juventude. O pai desta, porém, ao descobrir aquele flerte, manda Florentino procurar outros ares, pois não o considera um pretendente à altura para sua filha... eles acabam por afastar-se um do outro e em seguida ela casa com um dotô rico que chega na cidade.
A partir daí, Florentino Ariza decide esperar pela amada, nem que leve a vida toda para ficarem juntos – e (SPOILER! SPOILER!) é quase o tempo que leva mesmo para isso finalmente acontecer... vale salientar que, embora sempre com a amada no pensamento, Florentino não se abstém das outras mulheres do mundo: não, pelo contrário; o sujeito passa o rodo em simplesmente TODO rabo-de-saia que cruza seu caminho... porém, romanticamente, sempre pensando na amada (digamos assim que numa espécie de treinamento para quando estivessem juntos)...
 
Foi feita uma versão hoolywoodiana do livro para o cinema (com o Javier Barden no papel do Florentino Ariza e Fernanda Montenegro como mãe do protagonista), que, digamos, até que não é tão mau (vale essencialmente pela presença da belíssima Giovana Mezzogiorno no papel da Fermina Daza)... mas... hummm... sinceramente, achei meia boca e não recomendaria com muita ênfase (pra não dizer que definitivamente não recomendo, ou, ao menos, recomendo que se leia primeiro o livro – e depois, ok, se assista o filme e se decepcione com ele! Mas não se faça o caminho inverso, para não estragar o ótimo romance... e, bem... na verdade, para essa dica fazer sentido, o leitor não deveria nem estar lendo esta resenha, certo?... assim sendo, se leu até aqui, fazer o quê, né? Obrigado pela preferência! Já não precisa mais ler o livro, pois contei-o todo aí em cima e não precisa mais assistir ao filme, já que o que vale nele é a Giovana e é ela está aí embaixo pra você...).
Enfim, isso é que é romantismo de verdade, sem aquela pieguice grudenta da maioria dos últimos filmes e livros de “amor” da vida... fica a dica para a geração mela-cueca, de um grande romance romântico, que pode dar inclusive aos sonhadores de plantão algum alento ao se fazer vislumbrar aquele romance perdido no passado que você tanto fantasia ressurgindo um dia – e, ao menos no caso do livro, concluindo-se num futuro (beeeem) distante com um, literalmente, final feliz.
Ps: Ah, sim, o cólera (ou “a” cólera) do título se refere não à ira, fúria, e sim à doença transmitida pelo vibrião colérico (ver livros de biologia do segundo grau)...
A trama do livro se passa na Colômbia de Garcia Marquez numa época de epidemia da mesma que dizimou boa parte da população e que, aparentemente sendo mais uma dificuldade imposta pelo destino aos amantes, dando um tchan a mais no romance, no fim das contas acaba mesmo por ajudar a uni-los.
Moral da história: sem dúvida, pode haver vida inteligente em romances com o amor no título - às vezes, contudo, talvez só seja necessário um leve contraponto a ele para se atingir o devido equilíbrio.
  
(por Diego T. Hahn)
 

Frase da semana (por Johann Wolfgang von Goethe, ou, só Goethe - sim, como a avenida aquela em Poa mesmo)


“As pessoas tendem a colocar palavras onde faltam ideias.”

terça-feira, 11 de junho de 2013

Nossas façanhas (por Diego T. Hahn)

                                          
                                            Nossas façanhas

O pai observava atentamente o guri que zanzava pra cima e pra baixo do apartamento pilchado com sua bombacha e cantando o hino do Rio Grande...

            - “Como a aurora precursora”...
            O pai, nascido e crescido em meio ao campo lá pros lados de São Borja, perguntava-se se o filho fazia ideia do que significava a palavra “precursora”, mas admitia consigo mesmo que a pronúncia do guri era boa e a voz não era nada ruim também.
            Há dias o velho analisava o piá, adolescente na casa dos dezesseis anos, e aquele seu entusiasmo todo da repentina descoberta do Rio Grande do Sul como centro do Universo.
 Via-o digitando nas tais redes sociais na internet poemas e odes louvando o estado e sua suposta superioridade em relação ao resto do mundo, muitas vezes discutindo com gente natural de outros estados ou mesmo países, enaltecendo o histórico peleador do gaúcho, seu inconformismo, sua educação, a qualidade de vida local, e os grandes feitos também de Inter e Grêmio no futebol e... foi quando o velho, que efetivamente conhecia o histórico do estado, mas também sua realidade atual não tão maravilhosa e, mais maduro, embora continuasse gostando de sua terra, estava acostumado a analisar tudo sem aquele “ufanismo” gaudério que também ostentara um dia, se encheu daquilo tudo. Chegou no pirralho bem na hora que ele entoava o “sirvam nossas façanhas de modelo a toda Terra” e de mansinho o cutucou:
            - Vem cá, ô, guri... tu por um acaso sabia que hoje o nosso estado tem alguns dos piores índices de desenvolvimento do país?
            O filho o olhou assustado. Em seguida balbuciou algo como:
            - C-como?... Como assim, pai?...
            - É isso aí: alguns dos piores índices de educação, saneamento básico, asfaltamento de estradas, entre outros, do país... sabias?
-Bem capaz, pai!... nós... nós temos os melhores...
            - Nada de “nós”, tchê; o único “nós” que existe somos nós aqui: tua família; eu, tu, tua mãe e tua irmã... e, fora o que os números mostram, não tem nada dessa de melhores nem piores, é tudo ilusão...
            - Não pode ser, pai... aqui no sul a gente é mais politizado, mais civilizado e...
            - Civilizado? Tu ouviste falar da atual situação do Presídio Central de Porto Alegre? E se te gabas tanto da história do estado, deves certamente ter lido ou ouvido falar nas degolas de algumas das nossas revoluções, como a Federalista, por exemplo, não!?
            - Ah, pai... mas isso é coisa da guerra... é porque somos um povo aguerrido... veja só nossos times, que... – e quando começou a exemplificar que o Inter era o campeão de tudo e havia batido certa vez o poderoso Barcelona e o Grêmio era o Imortal tricolor copeiro que certa vez havia batido o Náutico com quatro a menos e que a raça do futebol gaúcho era mais um exemplo das façanhas do sul, o pai interrompeu-o novamente:
            - Sim... e tu sabias que certa vez o Inter perdeu para um time do Congo, chamado Mazembe? E que o Grêmio caiu duas vezes para a segunda divisão do futebol brasileiro?
            - Sim, mas... – ele tenta desconversar – nós temos nossas bonitas tradições... a bombacha, por exemplo... 
            - Sim, é verdade, temos bonitas tradições. Também gosto delas. Mas tu sabes por acaso quem foi que inventou a bombacha?
            - Ué... foram os... os farrapos, não foram?  - chutou o guri, meio sem jeito.
            - Não. Foram os turcos. E quem a trouxe para esses lados foram os ingleses...
            O guri se chocou. Não sabia daquilo. Não podia ser verdade. Mas, que diabos, devia ser, o pai não iria lhe mentir. Ou iria?
            - É isso aí, meu garoto: o mundo não começou com a Guerra dos Farrapos. Também gosto do nosso estado, filho, mas atualmente não sei se temos tantas façanhas assim para servir de modelo a TODA a Terra... – e jogou-lhe uns três livros de História sobre a cama – e mais um do Simões Lopes Neto, por via das dúvidas. Por fim apontou para os pés do garoto:
            - Bueno... e por mais que a bombacha seja um símbolo nosso – observou, rindo sardônico – ela não cai muito bem usada com tênis NAIQUE, tchê!!...
O guri olhou meio sem jeito para os próprios pés. O pai riu, foi até ele, abraçou-o e passou a mão no seu cabelo, escabelando-o, o guri riu de volta, e os dois foram para a sala disputar uma ferrenha partida de futebol no videogame, valendo o título de campeão do Universo – disputada, claro, em um Grenal. 

 
(Diego T. Hahn)
 

quinta-feira, 6 de junho de 2013

Bundas e ombros (por Emir Ross)

                        O Emir é um escritor portoalegrense acostumado a levantar canecos em concursos literários Brasil afora que, numa parceria  Poa - SM aí, gentilmente cedeu para o “De Letra” um de seus excelentes textos publicados no seu blog, "Milkway" (http://milkyway.blog.terra.com.br/).    
                                                  
                                  Bundas e ombros

Antigamente os árbitros vestiam preto. Vez em quando, uma camisa amarela. Bem vez em quando. O preto era o símbolo da imparcialidade. Da austeridade. Mas os tempos mudam. Hoje, eles vestem camisa, calção e meias verde-limão, rosa-choque ou outra cor brilhante que aparecer. Fúcsia sempre é uma ótima opção. A mudança na cor foi só o começo. Em suas bundas e ombros vibram marcas de lojas, de equipamentos eletrônicos e de etecétera. É o fim da imparcialidade. Como confiar em alguém que vende suas bundas e ombros para as marcas que pagam mais?
O mundo está mudando. O futebol é apenas o reflexo mais vistoso. Tudo parece à venda. Ou para aluguel. 
Não me será estranho o dia em que a denominação do nosso planeta for licenciada por períodos de tempo. Vejo os repórteres em matérias de telejornais: “A população do Planeta Terra Coca-Cola aumentou em doze por cento no último ano segundo dados revelados hoje.”
Como no mundo das grandes marcas tudo é ação-reação, o concorrente terá de ser criativo: no intervalo do mesmo telejornal, veicula filme de trinta segundos: pessoas num parque ensolarado, passeando felizes. E uma assinatura: “No Planeta Terra Coca-Cola, todos ficam mais felizes quando o Sol Pepsi brilha.”
Mas não é apenas o planeta em que você mora e a estrela que ilumina suas manhãs que terão nomes de grandes marcas. Você poderá ter que alugar seu próprio nome.
No Brasil, a família Silva perderia a hegemonia. Pelo desconto de dez por cento na compra de seu ar condicionado, você se chamará José da Silva Cônsul por dois anos. Mas seu nome não poderá aparecer em fichas sujas. Caso aconteça, o desconto vai pro brejo e a multa é alta.
Nesse caso, não sei se o pior é pagar a multa ou manter o Cônsul no nome. Ainda mais se seu time de futebol alugar o nome para a Eletrolux. “Cônsul torce para o Eletrolux.”. Quando o time perde, o presidente explica: “precisamos dar um choque de ânimo nos jogadores.” É estranho, mas é a vida. Será normal. Estranho seria não aproveitar as oportunidades.
Estas são igual pernas de pirigueti, se abrem a todo momento.
Quando esse dia chegar, e vai chegar, seu animal de estimação também entrará na jogada. Se chamará Motorola por três minutos e você ganhará mil bônus na compra do próximo videofone. Para isso, é só postar uma foto engraçada dele no Motobook.
Nesse aparelho, é proibido parecer menos feliz que os outros redenautas. Mas esse papo não é novidade.
Novidade será daqui a cento e quarenta e sete anos alguém desdizer isso.
Enquanto esse tempo não chega, sintonizo os canais de futebol. Vejo a grama verde e a torcida entusiasmada. E os árbitros alugando bundas e ombros. Mas, o que fazer, melhor nos deles do que no meu.
      

segunda-feira, 3 de junho de 2013

Pelos sebos da vida: Athena Livraria


         Seguindo no nosso passeio por agradáveis espaços onde se pode achar um bom livro em Santa Maria, hoje destacamos a Athena Livraria, que, embora não seja um sebo (Ei, só para esclarecer, também não temos nada contra outros espaços que comercializam livros que não estes; é só para não perder a viagem do título da sessão!), pode-se dizer que tem o espírito e o clima de um...




        Ótimo atendimento (costumo aparecer de tempos em tempos e, além de bater bons papos, encher o saco do pessoal lá perguntando por livros às vezes aparentemente impossíveis de se achar por aqui e eles sempre na maior paciência e boa vontade: “Não, infelizmente ESSE que tu queres não temos... talvez nem mesmo EXISTA mais... mas podemos tentar procurar e encomendar pra ti...” - e, de alguma forma, muitas vezes procuram e acham mesmo.) e um espaço aconchegante – especialmente no seu andar de cima, onde funciona a livraria em si (no térreo fica a revistaria), com sofazinhos e almofadas, onde dá mesmo vontade de se jogar ali e ficar folheando qualquer coisa pela tarde inteira (e no fim da mesma, claro, adquirir algo, nem que seja um Chico Bento, para não virar persona non grata na livraria).


       A Athena costuma promover também, além de lançamentos de livros de autores locais e regionais, eventos literários outros, como, por exemplo, comemorativos aos aniversários de músicos ou a datas relevantes de alguma obra sua – no ano passado rolou, entre outros, do Bob Dylan, do Elvis, do Neil Young – com bate-papo sobre a trajetória dos artistas, apresentação de músicos locais dando uma palhinha do repertório dos mesmos, e, obviamente, exposição de suas biografias e outros livros baseados neles (detalhe: em dias de eventos do gênero a procura por um "cantinho" na audiência é tamanha que algumas vezes se faz necessária a adoção de um sistema de retirada antecipada de fichas-senhas para participação).

      Para quem não sabe, a Athena fica na Alberto Pasqualini, próxima ao Santa Maria Shopping.
        Feito o toque, fica a dica.

Frase da semana (por Clarice Lispector)


“Que ninguém se engane, só se consegue a simplicidade através de muito trabalho”

sexta-feira, 31 de maio de 2013

Grupo Consórcio de Batatas da Laide (por Juliano Lanius)


Grupo Consórcio de Batatas da Laide

Almoço em família é muito engraçado. Aqui no Sul, o cardápio é quase sempre o mesmo: churrasco. Que bom! Qual é o gaúcho que não gosta de uma carne bem gorda e sangrenta? Ainda mais ao redor dos que nos amam e amamos também. Eu adoro.
 
Minha família não é muito diferente. Assim como na maioria das famílias, também temos o tio comediante, no caso, Tio Cláudio. Tio Cláudio possui certo dom natural para contar piadas, fazendo com que um ínfimo detalhe torne-se algo de que todos achem graça. A diferença – e vantagem – de Tio Cláudio para os outros tios é que ele frequentemente renova seu estoque de anedotas. Ainda bem, por que sempre tem aquele que conta a mesma piada todas as vezes que quer agradar. Sabemos quando Tio Cláudio está passando um pouco da conta no momento em que sua esposa, Tia Thereza, solta um: “Menos, Cláudio Augusto!”. Quando nosso nome sai por completo da boca de nossas esposas, ou mães, é que a coisa está feia para o nosso lado. E Tia Thereza tem certa implicância com seu nome. Não sei se ela pensa que as pessoas sempre erram ao escrever Thereza – e sempre erram – ou se pensa que as pessoas são analfabetas. Sempre que lhe perguntam seu nome, ela diz: “Thereza, com H e com Z, tá?”. A pessoa deve se sentir até meio coagida, pensando que ao menor erro de grafia vai receber um xingamento ou coisa parecida.

Também temos o gritão na nossa família. Você também tem um na sua? Pois é, e advinha quem é o gritão da minha? Meu pai. Pai para mim, Sérgio para as irmãs, e Tio Sérgio para as sobrinhas. Na escola, não ensinaram o princípio da propagação do som a meu pai. Ele não deve ter aprendido que as ondas sonoras perdem força à distância, mas que de perto são bem potentes. Acho que, às vezes, ele pensa que os vinte centímetros entre ele e a pessoa que o escuta não são suficientes para a intensidade com que ele fala. Pai, é mais do que suficiente.
Ah, na nossa família também temos aquela tia que recebe os convidados em sua casa, a anfitriã. Essa sempre é a mais prestativa, alcança os pratos, os garfos, as panelas e os copos. Bem pudera, já que ela é a dona da casa, ela é que tem que saber onde estão essas coisas. Tia Adelaide, mais conhecida como Tia Laide, é a que nos recebe na sua casa em muitos encontros familiares. Tia Laide é admirada por todos na família por sua maravilhosa salada de batatas (maionese, para os gaúchos). Tanto, que, mesmo quando os almoços aconteçam em outro local, ela sempre é a escolhida para fazer a maionese, ou lhe oferecem para fazer. Porém, em sua casa, ocorre um probleminha toda vez que ela prepara a tal salada. Geralmente, as pessoas preferem que a comida seja farta, que todos fiquem satisfeitos, ao invés de deixar os convidados com desejo de comer mais. Tia Laide não pensa assim. Para ela, se não sobrar nada, mesmo que um ou dois nem tenham comido, melhor. Não sei se é por que ela não gosta de guardar os restos ou por que ela quer realmente que as pessoas a elogiem e peçam que ela faça mais da próxima vez. Tipo massagem no ego, sabem?
E, pelo jeito, esta história é de longa data. No último almoço muitos disseram que Tia Laide sempre faz pouca maionese. A maioria explica que é a quantidade de batatas que ela cozinha a causa da fome alheia. Ela diz que a media correta é duas batatas por pessoa. Eu, sinceramente, não sei. Mas não custava nada colocar ao menos mais cinco batatas na panela.

Neste encontro, onde a polêmica foi grande, todos trouxeram idéias de como resolver a questão da falta de batatas na casa da Tia Laide. A hipótese que mais nos animou foi a possibilidade de plantarmos nossas próprias batatas. Concordamos em fazer uma espécie de “consórcio de batatas”. Cada um contribuirá com uma quantia ainda não estipulada de dinheiro. Esse investimento será para custear o terreno, que será arrendado na chácara de Tio Cláudio e Tia Thereza – com H e Z –, a compra das sementes e algum produto que seja necessário. A mão-de-obra vai ser familiar. Assim, não haverá mais desculpas por ter deixado as pessoas com angústia por não poder servir de mais uma colherada da bendita maionese.

O único problema é que até a primeira safra ainda teremos outros encontros. Por este motivo, deixo aqui um pedido aos produtores e comerciantes de batatas: estamos aceitando doações desta raiz de que tanto carece nossa família. As informações sobre como efetuar as doações podem ser obtidas através do meu email. E aqueles que se interessam em fazer parte deste consórcio, que fará um imenso bem aos amantes da maionese da Tia Laide, devem aguardar divulgação nos meios de comunicação. Depois de consolidado, o Grupo Consórcio de Batatas da Layde, fará doações da maionese a quem queira experimentar.
 
(Juliano Lanius)

terça-feira, 28 de maio de 2013

Felippão está convocando


Pois estão abertas até o dia 14 de junho as inscrições para o tradicional Concurso Literário Felippe D´Oliveira (e também para o Concurso Fotográfico Cidade de Santa Maria; nos últimos anos eles ocorrem quase sempre no mesmo período e seguindo mais ou menos o mesmo cronograma), que visa homenagear a memória do ilustre poeta santamariense (1890 – 1933).

O Felippe D´Oliveira, aberto para brasileiros moradores em todo o território nacional e exterior e que está em sua trigésima sexta edição, premia os três melhores textos em cada uma das categorias: Conto, Crônica e Poesia. Há também um prêmio de incentivo para autor local.
Boa oportunidade para quem gosta de se aventurar no mundo das letras (e tem paciência para imprimir 3 vias do texto, colocá-las num envelope grande, que será identificado com etiqueta número 1 e no qual deverá ser inserido também um cd com o texto gravado e etiquetado com o título do mesmo e um envelope menor, que será identificado com a etiqueta número 2 e no qual será inserida a ficha de inscrição e... Ufa! Enfim, aqueles costumeiros trâmites dos concursos) se testar. Ah, e além da “honra”, financeiramente o prêmio também não é de se desprezar: 3 mil reais para o primeiro lugar em cada categoria e 2 mil reais para o incentivo local. Todos os premiados recebem certificado.
Link do edital do Concurso:


Algumas curiosidades sobre Felippe D´Oliveira:
O pai do poeta, que era juiz municipal, foi assassinado antes do seu nascimento em frente ao local onde funcionava o Fórum de Santa Maria na época.
Embora nascido em Santa Maria, viveu e fez sua carreira fora da cidade – a maior parte no Rio de Janeiro.
Além de escritor, era também farmacêutico, jornalista, empresário e esgrimista.
Tendo apoiado a Revolução Constitucionalista de 1932, foi perseguido e exilado na França.
Faleceu perto de Paris em um acidente de carro.
Tem um busto seu, esculpido em bronze por Vitor Brecheret, na Praça Saldanha Marinho, em Santa Maria, exatamente em frente ao local onde funcionava o Fórum da cidade, onde seu pai fora assassinado – o busto está posicionado de costas, como simbolizando seu luto.


Extra-oficialmente: reza a lenda – na verdade contou-me um amigo, que pediu para não ser identificado como fonte, mas que não pestanejarei em fazê-lo em caso de eventual processo pela publicação deste “causo”! –  que haveria pessoas imbuídas da ideia de levar o busto embora para o centro do país – provavelmente para ala de determinado museu carioca que homenageia o poeta – pelo valor da escultura e por supostamente ser o mesmo mais identificado com o Rio de Janeiro, e assim autoridades da área cultural de Santa Maria temeriam por uma decapitação e subsequente “sumiço” da cabeça de Felippe D´Oliveira da praça na calada da noite, destacando inclusive vigilância especial noturna para evitar tal ato.
Verdade ou não, a história é interessante e, como dizem: se a lenda é mais interessante que o fato, publique-se a lenda.

segunda-feira, 27 de maio de 2013

terça-feira, 21 de maio de 2013

Pelos sebos da vida: "Gomorra", de Roberto Saviano (por Diego T. Hahn)


A Máfia.
Costuma-se muitas vezes designar certas organizações criminosas como entidades abstratas, intangíveis, algo grande demais para nossos reles olhos mortais, quando, na verdade, o modo operativo dessas organizações, como não poderia deixar de ser, desenvolve-se também como um trabalho operário de formiguinhas no dia-a-dia, no comércio - seja lá do que for - que pode estar acontecendo nesse exato momento ao nosso lado, enfim, é algo que faz parte também do nosso pequeno cotidiano, embora obviamente ninguém nos conte isso e a gente muitas vezes não faça também lá muita força  para ver.
 
Da autoria do italiano Roberto Saviano, Gomorra é uma excelente leitura, não somente pela fluidez de seu texto, mas especialmente por apresentar um panorama das entranhas do mundo mafioso – mais especificamente da Camorra, a máfia napolitana e a mais violenta da Itália – de um modo como talvez não tivesse sido feito até então.
Napoli é uma das cidades mais belas, mais pobres, e mais violentas da Itália – e mesmo da Europa – , com altas taxas de desemprego e poucas perspectivas para os jovens que resolvem lá permanecer ao invés de partir para uma Roma, uma Milão ou algum outro centro do norte do país com mais possibilidades, o que facilita o recrutamento das formiguinhas.
 
Saviano, natural da cidade, traça um retrato de partes da sua juventude caminhando lado a lado e vendo passar diante de si fatos e personagens que fazem parte da história desse mundo obscuro para a maioria.
 O autor narra minúcias sobre o contrabando no porto de Napoli, principal porta de entrada na Europa para produtos "sem procedência comprovada" (cerca de 60% da mercadoria que ali desembarca invade a Itália e o resto da Europa sem submeter-se aos tradicionais “empecilhos” alfandegários). Prédios no entorno do porto que são comprados e em seguida têm seus interiores completamente "esvaziados", tendo inclusive suas paredes divisórias derrubadas, transformam-se em verdadeiros esqueletos, para simplesmente servir de depósito para a mercadoria que chega pelo mar.
 
Passeia pelos fedorentos lixões clandestinos improvisados em certas zonas da Campania (a região da qual Napoli é capital) e para onde é levada grande parte do lixo tóxico de toda Europa, envenenando vidas ao redor, entre as quais as dos próprios chefões que lucram com tal negócio.
Expõe ainda o chocante treinamento militar ao qual são submetidos adolescentes recrutados pelo Sistema: meninos que são vestidos com coletes à prova de bala e em seguida atingidos por disparos à queima-roupa no peito, para acostumarem-se com a situação e perderem o medo diante do perigo.
Mas, ao mesmo tempo que visualizamos detalhes e minúcias do seu modus operandi, sim, ela talvez seja ainda grande demais para os nossos olhos – e nossa mente: costuma-se pensar em máfia como um fenômeno perdido lá no sul da Itália, quando seus tentáculos estão espalhados assustadoramente através de suas conexões econômicas não só por todo aquele país, como por boa parte da Europa, Estados Unidos, e outros tantos pontos desse nosso mundão velho de meu Deus – inclusive, veja só você, que surpresa, nosso belo Brasil varonil (anos atrás, um dos antigos chefões, Antonio Bardellino, foi morto no Rio de Janeiro, e outro, Tommaso Buscetta , preso em São Paulo, por exemplo).

E você pensa num mafioso como um tiozão sentado na sua poltrona com um charutão pendendo da boca e pose de Marlon Brando, capangas  com metralhadora ao redor, e, sim, talvez ele não fuja completamente desse estereótipo, mas o importante é saber que ele não é só isso, ele também é o político no congresso, e ele é o empresário trocando favores com esse político... e ele é parte de um ciclo que infelizmente talvez nunca tenha fim.
 
Interessante, por sinal, falar no estereótipo do Poderoso Chefão (o clássico filme, a propósito, é baseado no livro IL Padrino, do italiano Mario Puzo) pois, costuma-se pensar no mesmo, assim como em outros gângsters, como inspirados na máfia “real”, quando, na maioria das vezes, pelo contrário, o que acontece é que esses, os mafiosos da vida real, é que costumam inspirar-se nos filmes de gângsters e copiar certo modo de agir, falar, vestir-se. Certo chefe de determinado clan, conta por exemplo Saviano, mandou certa feita que se construísse no hall de entrada de sua casa uma réplica perfeita da escadaria da casa de Tony Montana, de Scarface, aquela do tiroteio insano de Al Pacino.
 
Roberto Saviano, após ver Gomorra transformar-se num sucesso de público e crítica, vendendo milhões de exemplares do livro na Itália e em todo o mundo, vive hoje sob escolta permanente em algum lugar desconhecido longe de sua terra natal - afinal está, logicamente, jurado de morte pela máfia. 
(por Diego T. Hahn)