quarta-feira, 10 de julho de 2013

Pelos sebos da vida: "1984", de George Orwell (por Diego T. Hahn)


 
Embora o detalhe da obra-prima publicada em 1949 por George Orwell que mais tenha se popularizado nos últimos tempos – ao menos no nosso Brasilzão – tenha sido o termo Big Brother - e infelizmente não pelos motivos mais, digamos, nobres, mas devido ao reality show que leva o nome do poder supremo da velha Oceania do livro (é, meu amigo, surpresa: não foi o Bial que inventou o Big Brother e nem a Globo que inventou o totalitarismo) - , cansamos de ver ainda referências a "1984" nos nossos dias de hoje...

Por que será?

Para quem nunca ouviu falar, um breve resumo: a história se passa na Oceania, um dos três países, junto com Eurásia e Lestásia, que restaram depois de uma grande guerra mundial e contra os quais Oceania está eternamente em guerra – mudando somente o inimigo de tempos em tempos; às vezes um, às vezes o outro. Neste país, o governo controla tudo através do Partido e seu líder supremo, o Big Brother (Grande Irmão), que não se sabe ao certo se é um símbolo ou um homem de carne e osso, mas que, definitivamente, está sempre de olho em tudo e todos. E disso não resta dúvida, pois todas as casas – e todos os recintos em geral – são monitorados através da teletela, exatamente uma tela que captura tudo que se faz e fala em qualquer espaço público ou privado. Faltam mantimentos e comida no país, todo o esforço de produção vai para incrementar a máquina bélica de Oceania, mas, independente de tudo, como o Partido controla – ou, pode-se dizer, É – o único meio de comunicação existente e através dele mostra como a vida está cada vez melhor para o povo e tudo que está sendo feito em seu benefício e as vitórias recorrentes do exército do país na guerra, o povo ama devotadamente o Grande Irmão.
Winston, o protagonista, porém, a um certo ponto, cansado de toda essa farsa e essa opressão, resolve rebelar-se contra essa dominação.
Sempre se associou a sociedade controlada descrita na obra ao regime soviético stalinista, o que sempre pareceu bem óbvio, já que Orwell era um socialista decepcionado com o regime totalitarista que imperava por aquelas bandas em tempos de Guerra Fria.
Pois, passado tanto tempo, caído o Muro de Berlim – e com ele, quase por completo, o comunismo – , por que "1984" continua tão atual e há sempre aqui e ali uma referência a ele, quando se fala de algum fato do nosso cotidiano atual? Não será tão somente para criticar os resquícios do comunismo presentes nos regimes de Cuba e da Coréia do Norte, será?
Pois, apesar de focar sua crítica, como dito anteriormente, no regime soviético do final dos anos 40, Orwell acabou tornando-se também mesmo uma espécie de “profeta” e vemos sua obra ainda atual e particularmente para este que aqui escreve muitas vezes fica difícil não visualizar a face do Grande Irmão em algumas bandeiras que tremulam imponentes hoje sobre nosso mundo globalizado - especialmente depois do vazamento de informações confidenciais da inteligência estadunidense que dão conta de que o país conta com um intrincado sistema de monitoramento de ligações telefônicas e comunicação em redes sociais, e-mails, e outras ferramentas, na internet, planeta afora...
(Como obviamente o paralelo feito não é de exclusividade aqui do "De Letra", as vendas de "1984" nos dias seguintes ao vazamento de tal informação aumentaram em mais de 7000% na livraria online Amazon, fazendo o livro passar em um dia do número 12.589  para o 184 no ranking dos mais vendidos do site.)
Ah, isso sem falar, claro, nos satélites, e seus Google Street Views e Google Earths e tal, a não nos deixar sumir do mapa... assim, estamos lá, queiramos ou não.
 
Pois a propósito de queiramos ou não, o mais incrível de tudo talvez seja exatamente isso: hoje em dia, às vezes até parece mesmo que queremos! - sem nos importarmos nem um pouco ou sequer pensarmos a respeito de eventuais consequências e efeitos colaterais...

Essa outra, por exemplo, pode não ser lá tão óbvia - e até um pouco paranoica, bem sei -, mas flagrei-me também algumas vezes em meio a devaneios imaginando a face imponente do Grande Irmão pairando na nossa velha e boa rede mundial de computadores, especialmente na tela de entrada de algumas redes sociais – como naquela do nosso amigo Facebook particularmente, que pela sua abrangência virou quase uma espécie de império virtual mundial.
O curioso, neste caso, é que esse suposto novo Grande Irmão seria tão sutil e perspicaz que não nos obrigaria a nada: ele conta com a nossa bondade e a nossa espontânea colaboração e nós, por contra própria, expomos tudo – nossos dados pessoais e aqueles de nossos familiares e amigos, nossos rostos, nossos corpos, nossa localização exata neste exato instante; enfim, nossa vida inteira – ali para ele.
E como o Facebook, por exemplo, foi uma das empresas que cedeu seus dados – ou melhor, o de seus “clientes”, ou sua “população” – ao governo norte-americano, seria, de certa forma, um “círculo que se fecha”...
Enfim, às vezes parece que o Grande Irmão se transformou, se adaptou, se refinou, fez-nos acreditar que é tudo legal hoje em dia, não há perigo nenhum, é tudo para o nosso bem. Não precisamos mais levar porrada como levou Winston na ficção de Orwell.
E, como é tudo inofensivo, é tudo pelo nosso bem, o Ministério do Amor continua ali, de prontidão (piada interna).
Ah, os motes do Partido, que controlava Oceania, eram: “Ignorance is strenght, freedom is slavery, war is peace” (ignorância é força, liberdade é escravidão, guerra é paz).
Mais alguma semelhança com a realidade talvez seja mera coincidência, uma fantástica profecia do escritor... ou pura obviedade.

(por Diego T. Hahn)
 

Um comentário:

  1. A respeito do assunto, eu escrevi http://adedeycastro.com/2013/07/08/que-feio-obama/
    Muito bom seu blog, meu amigo!

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