segunda-feira, 26 de janeiro de 2015

UFC MMA MMS YMCA (por Diego T. Hahn)


(Em homenagem ao retorno do Anderson Silva - lembra dele? Aquele da propaganda de seguro... - ao batente - e batente talvez seja mesmo o termo mais adequado para designar o ofício em questão - no próximo sábado, não poderíamos deixar de reprisar esta adorável crônica, publicada originalmente no "De Letra" - com alguns tons premonitórios, ou não!? - em 16 de julho de 2013, após a derrota do lutador - a primeira das duas contra o americano aquele - na defesa do cinturão)

Pra começar, confesso que nunca entendi bem esse esquema dessas siglas todas aí, quais as diferenças entre elas, se são categorias diversas ou se são todas a mesma coisa (dizem as más línguas que MMA, por exemplo, é a abreviatura de Muito Macho Agarrado, ou algo assim... não sei, não me prestei a ir pesquisar, mas creio que seja só intriga da oposição).
Mas, enfim... por falar em intriga, o que me intriga mesmo é todo esse fascínio que as tais lutas livres (ou como quer que se chamem) passaram a exercer no público nos últimos tempos.
 

Acho curioso, por exemplo, esse “surto” de artistas que viraram fãs do “esporte”  (por “coincidência”, quase todos vinculados – em bom português, têm contrato  – à rede que transmite as lutas por aqui)...


Acho engraçado também pessoas que antes condenavam, digamos, o boxe, pela sua violência agora terem virado igualmente fãs ardorosos dessa nova modalidade de combate.
Ah, e por falar em boxe: para garantir a integridade física, por assim dizer, dos lutadores, seja do boxe, como também das artes marciais, sempre foi exigido um mínimo de equipamentos de proteção, como luvas, capacetes, peiteiras, saqueiras (aqueles protetores anti-vasectomia traumática), etc...
E por que cargas d´água nos MMAS da vida não há esse cuidado e permite-se que os caras se arrebentem a pau sem proteção alguma?? (Cadê a Polícia Civil? A Federal? Direitos Humanos? ONU?? OTAN? ANVISA???)
Huuuuummm... aaaaaahh, sim... aham... percebo, percebo...
Olha, também assisto vez em quando, quando tô meio à toa na vida, mas a verdade é que sou um hipócrita assumido: não curto. O que me faz ver provavelmente é aquela curiosidade pelo grotesco, que nos faz seguir vendo um filme trash ou até mesmo algum reality show da vida... mas não curto. Por dois motivos principais:
Primeiro porque na realidade a maior parte do tempo da luta acho o negócio um tanto quanto chato... muita ensebação, como costumamos dizer por aqui: rola pra um lado, rola pro outro, se agarra, se solta, se agarra, se solta, rola pra um lado, rola pro outro... e nada.
E segundo, ainda que contraditoriamente em relação ao primeiro motivo, porque quando não estão naquele rala-e-rola sem graça, ao mesmo tempo não consigo compactuar com aquela porradaria extrema ali, caras com a cara arrebentada, sangue jorrando pra todo lado, e tudo aquilo exposto como algo “legal”, como só mais uma modalidade esportiva, pra todo mundo ver na tv, com patrocínios, propaganda, cachorro-quente, pipoca, e tudo...
Aliás, creio que a maioria hoje em dia no fundo continua a se chocar com toda aquela coisa insana ali dentro daquele ringue, mas não admite isso de forma alguma; pelo contrário: jura que acha o máximo!... parece mesmo que admitir que você não goste daquilo possa lhe fazer parecer fraco ou algo assim perante os olhos do resto do mundo...
Não, você tem que babar, gritar, esganar-se, clamando por porrada, por sangue! Isso sim é sinal de força!
Isso sim é sinal de virilidade, de masculinidade! (Ou de feminilidade, conforme o gênero do/da fã)...
Outra coisa interessante: curiosamente também até alguns dias atrás todo mundo babava pelo tal Anderson “Spider” Silva. Agora, dum dia pro outro, só pelo fato de ele ter levado umas bifas na orelha, todo mundo bombardeia o sujeito, chamando-o de arrogante, palhaço, mercenário, vendido, patife, canalha, sem-vergonha, bobo, feio, chato, entre outros tantos impropérios... parece mesmo uma espécie de ciúme:
“Ai, Spider, que óóóódio; beijou a lona e não a mim!...”
Pois vejam só: já eu, que não gostava do cara, agora passei a gostar – talvez exatamente por ele ter perdido. E acho que se é pra existir, tem que haver mesmo um pouco de arte no meio desse troço, um pouco de zoação – como nos velhos e bons telecatchs, por exemplo...
Uma das poucas coisas divertidas, aliás, desse negócio todo, que ao meu ver são as declarações do verdadeiro showman do ramo, o fanfarrão Chael Sonnen, ah!, disso a maioria dos fãs do “esporte” surpreendentemente parecem não gostar, criticam até mesmo, falam em “falta de respeito” e blá blá blá...
Mas isso talvez só seja um sintoma do nosso mundo: as pessoas preferem ver sangue a dar uma boa risada.
Ou levam realmente a sério todo esse circo.
E além do mais, lá vem os teóricos da conspiração de novo: ah, porque o cara entregou, assim como a Espanha entregou pro Brasil na Copa das Confederações e o Brasil pra França na Copa de 98 e...
Tudo bem, eu como um notório teórico das conspirações, respeito as teorias das conspirações alheias, mas essas aí confesso que já me parecem demais.
Uma coisa é dar a cara a tapa, outra a um puta soco que pode te matar.
Se bem que revendo o vídeo do nocaute agora, o Anderson Silva parece forçar bastante mesmo naquela frescura dele e quando ele está no chão o americano meio que “erra” alguns golpes, socando o ar e...

Para, para!! Para, se não eu já acabo me convencendo também!...
Já estou até começando a imaginar um retorno triunfal do Spider, tal qual Rocky Balboa em Rocky 2 diante do Apolo, o Doutrinador, tal qual Superman em Superman 2 diante dos vilões da zona fantasma, tal qual o Grêmio na Segundona diante do Náutico (felizmente não posso citar o meu time como exemplo, pois ele nunca teve um retorno triunfal desses), enfim, um retorno triunfal, reconquistando o cinturão em uma revanche es-pe-ta-cu-lar, épica ,história... afinal, quem não gosta de uma revanche es-pe-ta-cu-lar, épica, história??
Os humildes serão exaltados. E Anderson Silva voltará, depois de humilhado, mais humilde (embora com bem mais grana no bolso) e triunfará.
Anderson Silva é nosso pastor e nada nos faltará.
Porém...
Há teorias também que dão conta que Chris Weidman é um robô, fabricado pela NASA, sob encomenda da CIA, um protótipo de última geração, para botar ordem na casa e manter o imperialismo  ianque em dia. Que porra era essa de um negão do Mercosul mandar no octógono? Já não bastou o “barbudo das Arábia” ter detonado nosso pentágono?
Bom, mas voltando o foco da questão ao nosso estimado público:
E você, cara – sim, você aí, barbado – , não se envergonha, de convidar sua namorada para assistir às duas da madruga de um sábado a dois caras suados só de sunga se agarrando??
Já não bastam os vinte e dois correndo atrás da bola no sábado à tarde?
Até uma infame duma comédia romântica é preferível nesse caso, pô!...
Eu, como disse antes, até assisto também, mas isso se não houver duas moças se agarrando em algum outro canal. Preferência sempre delas, claro. Ladies first.
(Imagem proibida para menores de 18!)
E, para finalizar (tranquilamente, sem chave de braço ou de perna), não querendo dar uma de moralista – embora talvez já dando –, mas quanto a esse papo que as lutas não incentivam a violência, não são um mau exemplo porque é só um esporte e tudo deve ficar ali dentro do ringue e blá blá blá, fica a interrogação:
Se quando é fã de futebol, a gurizadinha mais nova vai pra rua imitar os jogadores chutando uma bola, agora com essa nova geração correndo o risco de virar fã dos MMAs e UFCs da vida, graças a todo esse destaque e propaganda em cima do relativamente novo esporte, vão imitá-los como? Indo para a rua chutar o quê, exatamente?
Enfim, são só conjecturas meio perdidas de mais um sujeito chato que às vezes parece mesmo não achar nada engraçado, macaco, praia, tobogã, UFC, MMA, eu acho tudo isso um saco, mas, bem, é isso, e depois de tudo isso, se você é um lutador esquentadinho e não gostou do que foi escrito aqui, não te faz de rogado, cara: pode vir! Vem! VEM! Vem, que eu encaro a bronca...
Não uso sunga nem pra tomar banho de mar, mas fiz judô no colégio até a faixa azul, porra!!! 

quinta-feira, 15 de janeiro de 2015

Vista da sacada (por Diogo Couto)

 
E fazendo sua surpreendente estreia na área da poesia aqui no De Letra nosso amigo de fé, irmão camarada, Diogo Couto, vulgo Diogão, piloto aéreo nas horas vagas, quando não está filosofando sobre a vida. Recebemos do nada um dia esse seu maravilhoso texto via e-mail (certamente inspirado pelo que vê lá de cima, mas provavelmente também por um de seus Hemingways ou Kerouacks que carrega invariavelmente embaixo do braço - mesmo quando está pilotando um avião!) dizendo lá nada além do que segue abaixo... ninguém sabe por onde anda a figura hoje em dia (últimas informações, embora um tanto quanto desencontradas, dão conta que pros lados do espaço aéreo goiano... outros dizem, porém, que foi abduzido por jupterianos anfetaminados e indecentes, que o recrutaram com o intuito de fazer experiências sexuais com um espécime terrestre e implantar-lhe um chip em um local do corpo que não podemos mencionar aqui), há tempos o sujeito não dá as caras (dá sinal de vida aí, seu porra!!), mas certamente esse filho da mãe abençoado com uma alma poeticamente conturbada está bem onde estiver e, além de para não escondermos do mundo essa preciosidade abaixo, também para matarmos um pouco da saudade do mesmo, não poderíamos deixar de publicar o que segue:
 
 
Por você eu deixo de ser coruja e viro cotovia
pra assim andar só de dia
por você
 
a temperatura caiu e o céu se encheu de um rubro pastoso
 
 
lânguidas nuvens que quase posso tocar
 
 
cheiro de almíscar e solidão
 
mórbido asfalto
 
 
sereno orvalho
 
secas gramíneas
 
multidões solitárias
 
poeira e fumaça
 
luzes ascendem paralelas, verticais
 
telhas do mais barato barro
 
borracha e carne
 
 
tô te dizendo tudo o que tô vendo
 
rostos cuidadosamente embelezados, inexpressivos
 
às vezes uma tímida lua me espreita pelo buraco da janela cinza de nuvens
 
o que ela quer?
 
 
tô na sacada da poesia e lá embaixo nada e tudo, mescla pastosa de dúvida
 
 
pode ser
 
afinal acho que nada é
 
não tem que haver pontos nem vírgulas,
apenas um rolo de papel higiênico
 
 
cheiro de café e sorriso
 
então pare
 
estático alvoroço
 
 
maravilhoso
 
cool feet
 
longa tarde, ciclo eterno de esperas
 
leve frio, denso ar, agressivo barulho do silêncio
 
 
vira o disco ou a página
ou vira louco,
artista quem sabe um lobo
 
vira lata, vira casaca,
vira o copo
 
 
tô na sacada da poesia
lá embaixo tudo e nada
mescla pastosa de dúvida
 

sexta-feira, 9 de janeiro de 2015

Frase da semana (por André Gide)



E pra começar botando 2015:


"Acredite naqueles que buscam a verdade; 

duvide dos que já a encontraram".


(André Gide - 1869 - 1951 -, escritor francês, Nobel de Literatura). 



quinta-feira, 25 de dezembro de 2014

O Poeta Incompreendido, partidas e fim de ano

(por Diego T. Hahn)

Dia desses fui surpreendido com a notícia na sessão das cartas do leitor de um jornal santa-mariense. Pelo que constava ali, não sei das circunstâncias (ainda busco mais informações a respeito), mas nosso Poeta Incompreendido, o Gilson, teria partido recentemente. Surpreendido, pois cruzava frequentemente com ele no centro de nossa cidade, mesmo nos últimos tempos, e, difícil arriscar sua idade (jeito jovem e descontraído; aspecto físico meio judiado), algo entre 35 e 50?, mas creio que não tivesse mesmo mais do que 50 anos de idade e seria capaz de apostar que ainda estivesse longe dessa "cifra", provavelmente por volta dos quarenta e poucos, e sem sinais de algum grave problema de saúde mais evidente... mas, enfim.

Conheci o Gilson ao trocar uma ideia com ele uma tarde no Café Cristal, enquanto adquiria um dos seus compêndios poéticos xerocados (impregnados com algumas rimas óbvias e de uma certa ingenuidade, é verdade - que curiosamente contrastavam com sua aparência "ameaçadora", jaqueta jeans surrada, olhos meio caídos, bochechas infladas, cabeleira caindo no rosto, que por vezes até assustava alguns cidadãos mais "tradicionais" e conservadores -, mas características poéticas essas que acabavam por só fazer se vislumbrar uma pureza e um bom coração que deviam haver ali debaixo daquelas camadas de incompreensão).
E, coincidentemente, na Feira do Livro deste ano em SM autografamos lado a lado nossos lançamentos (aqui o link de um comentário que fiz à época da obra dele em parceria com outros 2 escritores locais: http://deletradj.blogspot.com.br/2014/05/3-poetas-em-1-opusculo.html).

Uma simpática e já folclórica figura da "cultura de rua" da nossa cidade que estava sempre "por ali" e agora não está mais - quem conheceu, conheceu; quem não conheceu...
Bem, ainda pode conhecê-lo no seu legado escrito.

Num ano de tantas partidas - independente do nível de precocidade das mesmas e da proximidade com os que partiram, igualmente todas doídas para nós que ficamos (e para nós que ficamos quase sempre acabarão por soar precoces, não é mesmo?) - acho justo encerrarmos o mesmo no "De Letra" homenageando todos esses que se foram, independente das suas áreas de atuação, mas em consonância com a temática aqui do blog, na figura do Poeta Incompreendido (com um poema do mesmo e outro - tradicionalmente conhecido igualmente por sua referência a partidas, do qual gosto muito e que usei também na página das dedicatórias in memorian do meu "Histórias reais de amigos imaginários (e vice-versa)" - de John Donne).

Abraços e um melhor 2015 para todos nós!!

“Nenhum homem é uma ilha isolada; cada homem é uma partícula do continente, uma parte da terra; se um torrão é arrastado para o mar, a Europa fica diminuída, como se fosse um promontório, como se fosse a casa dos teus amigos ou a tua própria; a morte de qualquer homem diminui-me, porque sou parte do gênero humano. E por isso não perguntes por quem os sinos dobram; eles dobram por ti”.

("Meditação 17" - mais conhecido por "Por quem os sinos dobram" - John Donne)


"Flores desabrocham e fenecem
Frutos crescem e amadurecem
As pessoas nascem e envelhecem

Os sentimentos aparecem e vão
De trem ou de caminhão
Eu fico sozinho na estação
De repente alguém toca uma bola de canhão
Na nossa relação
Se eu passar por essa provação
Esvaído de sangue no chão
Olho para você e pergunto
Por que não?
Mesmo no último segundo
Só escuto um murmúrio
E fico sem entender nada!!!"

("Flores" - Gilson, o Poeta Incompreendido)



sexta-feira, 12 de dezembro de 2014

Lançamento do "Minha camisa vermelha"


Para os amigos colorados (e, por que não?, também os gremistas, afinal, como se diz, o que seria do azul sem o vermelho e do vermelho sem o azul?, e certamente, de um jeito ou de outro, o co-irmão também é mencionado lá na obra :) - e, bom, por que nos restringirmos?, estendido obviamente também aos torcedores do, sei lá, Guarani de Venâncio, Aimoré, Ferro Carril, Rondonópolis, Real Madrid, especialmente aos do Anapolina, Boca Juniors e Ajax, e, enfim, de todos os times do mundo, até mesmo aos do Mazembe!, já que, independentemente do time, os assuntos da obra giram em torno dessa paixão mundial que é o futebol e, no caso, o que vale é a diversão), vai aí o convite do lançamento pela Editora Movimento do livro de crônicas sobre o Inter, "Minha camisa vermelha", parceria dos 5 autores (santa-marienses de nascimento ou adoção, mas colorados de coração), elencados no convite abaixo, na próxima quarta, 17 de dezembroa partir das 17 horas, na Athena Livraria, em Santa Maria.


Quem estiver pela área, seja pra se gabar dos feitos do Colorado ou só pra trocar uma flauta mesmo, dê um pulo lá! 


terça-feira, 2 de dezembro de 2014

Pelos sebos da vida: "Hulk na Encruzilhada" (por Diego T. Hahn)



"E lá vem ele com quadrinhos de novo..." (é, não adianta, cara, ando meio viciado mesmo, fazer o quê!? - mas, ok, na próxima intervenção com a sessão "Pelos sebos..." prometo resenhar - ou avacalhar - um livro "de verdade", "sério", e tals)


Mas o fato é que aí está, direto do túnel do tempo: Hulk na Encruzilhada.



Esta série (ou arco de histórias, como se costuma designar no mundo das hqs), assim como as outras duas (a do Sombra e a do Wolverine) resenhadas anteriormente aqui, saiu no Brasil lá pelo final dos anos 80 e é tão foda, mas tão foda, que foi a culpada por um dos dois únicos crimes que cometi nesta vida: o furto de uma revistinha, no antigo Supermercado Real - atual Big - , por volta dos 10 ou 12 anos, diante do fato de não ter um puto no bolso e os coroas não quererem colaborar com a minha voracidade literária de então (o outro delito foi da mesma tipologia e mais ou menos pela mesma época de delinquência mirim: dez pila surrupiados da carteira do meu velho). Posso confessar isso hoje sem medo de ter a porta arrombada pelos tiras e sair algemado diretamente para o camburão, pois, passados mais de 20 anos, tenho quase certeza que esses crimes já prescreveram (e meu pai também já não pode mais me botar de castigo nem nada do gênero), mas lembro bem da minha tensão durante a execução do plano no mercado (o que me deixou claro que definitivamente a carreira no crime não era a minha praia - e, que diabos de ladrão se especializa no furto de revistas em quadrinhos mesmo??)...



Mas, divagações legais e morais à parte, lembro também que a história que mais me marcou nessa série foi a dos cavaleiros de ferro num dos mundos alternativos da tal encruzilhada. Curiosamente, assim como aconteceu com o personagem principal em "Eu, Wolverine", no início dessa história o gigante esmeralda surpreendentemente toma uma sova daquelas! Obviamente é a deixa para toda uma reviravolta com a devida redenção, que incluía como aliada uma moça verde que chorava flores, mas, naquele primeiro momento é de realmente fazer sentir pena do monstrengo, que, após a surra, ainda é preso e usado pelos cavaleiros de ferro como escravo em algumas obras de, digamos, "construção civil" (por exemplo, acorrentado, girando as engrenagens de um imenso moedor de crânios destinados a serem usados na construção de castelos), com direito a chibatadas e tudo...



Foram várias revistinhas, do início ao fim da função do Hulk nesse universo paralelo. Ele fora enviado para lá pelo Dr. Estranho, após ficar fora de controle na Terra, perdendo o pouco de senso de humanidade que ainda lhe restava e transformando-se num puro monstro, destruindo tudo ao seu redor. 


                                     
Na tal Encruzilhada Interdimensional, o Dr Estranho, que era seu amigo, acreditava que ele poderia achar um mundo - entre os vários possíveis lá, acessáveis através de portais - onde poderia ser feliz (e, parte também de um feitiço implantado pelo Dr. Estranho, cada vez que o Gigante Esmeralda entrasse num portal e se sentisse infeliz naquele novo mundo, seria levado automaticamente de volta à Encruzilhada).

Assim, Hulk ia tentando, portal após portal, adentrando esses diversos mundos, com geografias e personagens diferentes, e, infelizmente, assim como no mundo dos cavaleiros de ferro, invariavelmente se dando mal neles - e, consequentemente, sempre voltando ao limbo da Encruzilhada.



Um capítulo épico também dessa sequência de histórias é o encontro de Hulk na Encruzilhada com o quarteto de inimigos chamado Os Alienígenas (Vetor, Encouraçado, Raio X e Vapor - imagem abaixo), episódio que tem uma das capas mais marcantes da série (era a única capa, inclusive, desse arco de histórias do Hulk da qual eu lembrava ainda nos dias de hoje, e capa que emulava um daqueles duelos dos faroestes, só que com todo um fundo surreal da Encruzilhada ao invés dos desertos do Texas ou algo assim, com os 4 vilões perfilados diante de Hulk).



Um grande personagem - se não o maior - a se destacar desse arco de histórias também é o "Pompons coletivos", que é exatamente isso, um agrupamento de pompons que vive na encruzilhada e com quem Hulk faz amizade. Dei risada da lembrança quando comecei a ler e apareceram os tais pompons. 



Mas não me lembrava que não havia motivo para risos (ATENÇÃO: SPOILERAÇO!): fiquei realmente chocado ao seguir lendo e deparar-me, algumas revistas de muito sofrimento do Hulk depois, com os malditos pompons tentando sacanear o gigante, revelando-se pois uma entidade do mal!!



PQP!!

Não dá pra confiar realmente em ninguém hoje em dia... nem nos pompons coletivos!!

Mas... fazer o quê?

                                   Hulk e os Pompons Coletivos

No fim das contas, depois de muito penar na tal Encruzilhada Interdimensional, o Gigante Esmeralda acabou voltando à Terra, e assim Hulk segue sua vida, verde como sempre, embora mais maduro depois dessa experiência traumática (essa foi péssima, eu sei - assim como as infames piadinhas das fotos acima e abaixo - , mas não podia perder a deixa!) e eu, de lambuja, matei mais uma saudade literária dos tempos de infância.                                      

Hulk na Encruzilhada


terça-feira, 18 de novembro de 2014

"Vento sul" e "Vigia" (por Guto Dauber)


E esta semana, outra participação especial no blog: desta vez do camarada poeta, músico e filósofo de bar Guto Dauber - também conhecido como Master Saviux - com dois de seus poemas, que jaziam egoisticamente arquivados numa gaveta qualquer por aí...


Vento Sul
 
Venho não se sabe bem de onde
Vejo o universo no horizonte
Fujo da sombra que assombra o homem
E a dor
 
Venho não se sabe bem de ontem
Vejo o que se sabe sobre hoje
Vento que assopra a vida e esconde
A dor
 
Vales de vento e de sombra, será?
Que em outros lugares o vento espera
 
Talvez de seus olhos me vejam
Nos turvos de uma fagulha
Barulhos de vidas passadas
Relatos de noites escuras
 
 
- - - - - - - - - - - - - - -- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -
 
Vigia
 
De vigília te vigio
Na noite turva
Do sono profundo
Te espero pra ontem
Te guardo memória
Da noite de outros dias
Vergonhas de fora
Vontade eu tenho
Coragem, meu bem,
Porém...

 
 
 

quinta-feira, 13 de novembro de 2014

Recuos e avanços (por Celina Fleig Mayer)


Em mais uma participação especial no "De Letra", temos a honra de apresentar esta mordaz crônica nos enviada pela amiga e ilustre escritora, integrante da Academia Santa-Mariense de Letras, Celina Fleig Mayer:

                O casamento é uma espécie de sociedade “mista” em que seus componentes precisam fazer concessões... Quando as coisas – essa palavrinha é muito abrangente, então diremos, quando a relação não vai muito bem, é preciso marcar uma reunião. Geralmente as pessoas chamam isso de “discutir a relação”, mas não é bem assim, até porque já começar com discussão pode levar a rupturas. Reunião é melhor, e ela, para um casal, pode surgir “do nada”, de uma paisagem, de um gramado cheio de orvalho, qualquer acontecimento. Aliás, fatos novos sempre ensejam uma “reunião”, sejam eles proporcionados por amigos, parentes ou entre o casal. Nasceu o filho, a mulher anda tresnoitada e resmungona? Reunião presidida pelo excelentíssimo “sócio” que está de cabeça fria. E, especialmente, deve se mostrar cheio de compreensão e amor para dar. Isso rende juros e “correção” de comportamento.

            Dia desses recebi um emeil de um amigo que dizia nos invejar, marido e eu, porque íamos para a praia, por uns dez dias, quase mensalmente. Menos, lógico, naqueles meses bem frios, porque os pisos  dos apartamentos de praia dão uma sensação térmica além da realidade. Aí ficamos aqui sobre o piso de madeira, aconchegados junto a lareira. Mas, voltando à “santa inveja” do amigo, que ele é uma pessoa muito legal, se explicava que a Madalena dele não gostava de praia.  Desde o começo dos tempos, isto é, da longa união de mais de 30 anos. Faltou um acordo inicial para resolver essa pendenga,tipo: “Como assim, Madá? Que é que tem de ruim na praia? Vai ver que nunca gostaste por causa da companhia, vindo comigo vai ser diferente. Prometo! A gente fica lá, longe desse calorão, guarda-sol armado  junto ao mar, aquela brisa”...Acredito que agora, já é um tanto tarde, a mulher não terá vontade de exibir  curvas passadas e perdidas, por pior que seja o verão na sua cidade. Não vai se deixar convencer. Essa reunião nem deve acontecer mais, por falta de quorum...

Tão acostumada ela a ser do contra que, na ocasião de comemorarem com os ex-colegas do marido o aniversário de 35 anos de formatura da Faculdade, onde ele estudou, o cara chegou sem sua Madalena. Todo mundo compareceu acompanhado da antiga ou da atual consorte. E aí? Perguntavam. Estás viúvo? Ele explicou que a Madá não gostava de viajar...

            Constatei, então, o quanto um casamento pode amofinar uma pessoa, abafar até, se ela não tenta um acordo em tempo hábil, bem no início das primeiras “manifestações” contrárias da outra parte. Esse amigo devia vir informando suas vontades, negociando suas preferências para caberem nos contras da parte da mulher. Cedendo aqui, avançando ali. Fico imaginando como deve ser a “função” de mesa e cama, (ou o inverso), desse casal. Ele amanhece “todo-todo”, e ela vai ficando uma “arara”, só repetindo: “para com isso, homem!” No mínimo, a Madalena é daquelas mulheres que sofre de dor de cabeça persistente...

            Um autor, numa crônica inspirada, escreveu uma frase genial: “Os casamentos longos acontecem muito mais pelos recuos do que pelos avanços...” Pelo jeito, a mulher do meu amigo tem se aproveitado muito dos recuos dele. E, enquanto os dois vêm avançando em idade, ela vai aumentando seu território.a de campo.u territdade  Não sei o que é que vai sobrar, no fim de contas, para o pobre...


sexta-feira, 7 de novembro de 2014

Terror (por Diego T. Hahn)


Bom, passado o período de (intensas) campanhas e todo o (feroz) debate político gerado pelas mesmas, e, na sequência, a famigerada eleição, com seus resultados, que geraram mais (feroz) debate político, o que me veio à cabeça e fiquei aqui a matutar intrigado nos últimos dias foi o seguinte:


Por que será que no Brasil o Jason é mais conhecido que o Michael Myers?


Pra quem não sabe, o Jason Voorhees é o personagem principal da série cinematográfica Sexta-Feira 13. Aquele, da máscara de hóquei branca, com uns furinhos. 

                                                      "Prazer. Jason."


O Myers é o da série Halloween. O da máscara de monstro, também branca.

                                                   "Myers. Michael Myers."


Ambos, psicopatas, vivos-mortos, cujos filmes originais tiveram várias sequências (Sexta-Feira 13, acho que mais de 10 - seriam 12?... Halloween, creio que umas sete ou oito - não sei, não me prestei a abrir o google aqui e pesquisar, gosto mais de escrever essas coisas assim, alicerçado só no apoio da memória Hahn - embora não tão confiável, é mais divertido). 


Pois quem no Brasil não sabe quem é o Jason?


Todo mundo conhece o Jason!


O Jason virou apelido até de uma daquelas sandálias com uns furinhos e tal, pela semelhança com a sua máscara... 


Mas por que o Michael Myers não é tão conhecido assim por aqui?

Pergunta por aí: poucos sabem quem é.
 
Me arriscaria a dizer que, entre o público com um mínimo conhecimento cinéfilo, algo em torno de 70% das pessoas sabem quem é o Jason, mas esse percentual deve cair pela metade, se não menos, em se tratando do Myers.
 
O fato é que o Myers me parece mais "cult", enquanto o Jason, mais "pop".


E por quê?


Como disse antes, ambos são psicopatas, quietões, caminham devagar enquanto perseguem suas vítimas antes de trucidá-las...


Será que é por que o Jason andou distribuindo bolsa-família? Não creio. Jason não tem nada de família. Na verdade, ele odeia famílias. Ele as destrói. Myers também - na verdade mais ainda: sua meta principal desde sempre é matar a própria irmã, por exemplo.
 


Será o marqueteiro do Jason melhor que o do Myers?


 
Será a máscara, mais legal?
 
 
 Será que é porque a gente se "identifica" mais com a Sexta-Feira 13, que vez em quando temos por aqui, e menos com o Halloween, que vemos talvez como um evento meio "artificial", puramente norte-americanizado?


Não sei.

Pode ser tudo isso e muito mais, mas também pode ser que não seja nada disso e - mesmo tendo-se em conta que independente de qual dos dois você escolha colocar pra rodar, provavelmente ele vai te apavorar com eficiência, fazendo mais ou menos tantos estragos na sua telinha quanto o outro faria - a resposta seja bem simples:


Talvez o pessoal simplesmente não vá com a cara do Michael Myers. 
 


(Sim, eu aproveitei para este texto o momento das tais das eleições, aproveitei igualmente a data do Halloween que foi esses dias, e, sim, deve ter também alguma espécie de metáfora, alegoria, ou coisa que o valha aí... ou não!)
 
 

terça-feira, 21 de outubro de 2014

A lenda do cachorro sem cabeça - réquiem para uma pequena grande amizade (por Diego T. Hahn)



Uma das marcas registradas da Upi eram os seus chamados “truques”:

Sentava.

Deitava.

Dava a pata.

Fazia “cabecinha” (consistia em, ao ouvir tal comando, apoiar a cabeça num joelho humano – geralmente, como também ao atender às ordens anteriores, para ganhar algum pedaço de comida, claro).











Mas o melhor de todos mesmo era fazer sumir a cabeça:

Com o intuito de revirar o lixo, subia no cesto, enfiava a cabeça lá, e, para quem olhava a alguns metros de distância, lá estava ela, naquela curiosa posição, de pé e “sem cabeça”.

E eis que surge uma lenda.

Mas esse “sem cabeça”, devo dizer, refere-se a uma impressão física tão somente, pois intelectualmente, tínhamos certeza, como bons donos(?)-amigos(?)-“pais”(?)-“tios”(?)-“irmãos”(?) corujas, que ela era a mais esperta do mundo e talvez de toda a história de sua espécie (que Lassie, Benji e Rintintim o quê!) – e, confesso, chegamos a vislumbrar maquiavelicamente algumas vezes até mesmo uma carreira no circo (veja você, ela era do tempo em que ainda havia animais no circo...), naqueles programinhas de auditório, ou algo assim.

A Upi, pra quem não sabe (O quê? Tem mesmo gente que não sabe??), era uma cadelinha, meio poodle meio vira-lata, meio preta meio marrom (curiosamente, da metade do lombo pra frente, da primeira cor; da metade pra trás, da segunda), que vivia em uma gamela - sim, uma gamela, dessas de churrasco, mas forrada com um confortável travesseiro, claro - embaixo da mesa de passar roupa, oficialmente “filha” da minha irmã, mas na prática um patrimônio vivo da família – chegou aqui há 15 anos, comprada por 50 “pila”, mas, com o passar dos anos, sua cotação extrapolou todos os limites na nossa bolsa de valores familiar e chegou a valores antes inimagináveis até mesmo para nós. 

Tinha jeito de lady, como comentavam as pessoas pela rua: era magra, esbelta, pernas longas, e caminhava serena e meio indiferente ao resto do mundo. Era uma verdadeira dama.

Embora canina, a propósito de elegância, a Upi tinha hábitos mais parecidos com os dos felinos (brincávamos que ela era uma cruza de poodle com gato): gostava de passar embaixo das nossas pernas, levantando e esfregando as costas, uma, duas, três, dez vezes seguidas; queria sempre estar por perto - especialmente para acompanhar numa soneca; era parceira pra 24 horas ininterruptas nos braços de Morfeu, se fosse o caso -, mas não era lá muito chegada a alguém pegando e apertando e abraçando ela; e não curtia lá muito cachorros (teve apenas um romance-relâmpago com um tal Alaor Malaquias, um vira-lata errante, com o qual corria alegre e surpreendentemente – primeiro porque não gostava de cachorros, e segundo porque, como uma boa dama, não gostava de correr – pela grama do parque).                                                                                                                                          
                 
           A dama e o vagabundo

Mas, claro, como todo cachorro de família, ela se achava era gente – e, como toda família com cachorro, meio que gente era mesmo pra gente.

Quinze anos.

Uma vida.

Literalmente: a sua. Mas também parte relevante de outras. Quando ela chegou, eu tinha 21. Pode-se, pois, dizer que ela meio que me viu também virar gente.

É curioso, inclusive, por falar em gente, pensar que ela, quietinha ali no seu cantinho, talvez me conhecesse melhor que muita gente com a qual convivo hoje e mesmo melhor que muita gente com a qual convivo há muito tempo.

Ah, não que eu tivesse dúvidas a respeito, mas Upi também ajudou a consolidar a segurança na minha masculinidade – afinal, convenhamos, o cara tem que ser muito macho pra sair pra passear todo dia pela rua com um poodlezinho, e de fitinhas rosas nas orelhas! (nas dela, claro, mas, mesmo assim...).

Upi teve um histórico médico conturbado – e recuperações fulminantes, por vezes quase milagrosas. 
Pois vejamos:

Nos primeiros meses de idade, teve uma terrível doença de pele, que a deixou debilitada e completamente careca, um ratinho branco – ela que era de pelagem preta encaracolada – com feridas pelo corpo. Lembro que o quadro era realmente muito feio e tinha certeza que, por mais que fizéssemos de tudo para tentar o contrário – e fizemos – ela não escaparia daquela.

Mas pouco a pouco foi se recuperando e, milagrosamente, alguns meses depois estava lá, toda pimpona, ostentando seus cachos pelo Parque Itaimbé.

Nos seus primeiros anos de vida, Upi também atravessou corajosa e displicentemente a Venâncio Aires na hora do pico, ao escapar da gente na garagem de casa. Quando vimos, estava ela lá do outro lado do mundo da calçada, dando uma banda em frente ao cartório do Xisto, enquanto os carros passavam voando entre nós. Segundo milagre.

Chocólatra, desafiou inúmeras vezes a toxidade do doce para os da sua espécie e subia em camas e cadeiras e mesas para furtar bis, trufas e bombons dos mais diversos – às vezes, se não conseguindo abri-los, devorando-os com papel e tudo, descobríamos surpresos depois quando regurgitava tudo, como dizendo “que porcaria; por que não fazem um negócio mais fácil de se abrir com os dentes?”.

Ela também “foi pra faca” uma meia dúzia de vezes, por motivos diversos - surgimento de tumores, inflamação dos dentes, etc - e a apreensão era sempre grande. Nunca sabíamos se retornaria daquelas batalhas, as cirurgias começaram depois que já tinha uma certa idade, havia a questão da anestesia e tal e... e eis que de repente lá estava ela de volta, novamente zanzando indiferente pela casa, no seu ritmo próprio, revirando lixos e tenteando nossa comida, um tanto quanto blasé, como se nada fosse.

Upi despencou dentro de casa de uma escada daquelas do tipo caracol do segundo pro primeiro andar duas vezes. Na primeira, ainda cheia de pontos, recuperando-se de uma das cirurgias, caiu por um vão, bateu num degrau lá embaixo e em seguida chocou-se contra o chão. Deu um grito e nada mais, seguindo seu rumo normalmente, agora no andar de baixo. Mais uma proeza da cadela de 7 vidas.
                                                          

Upi e seu esporte radical predileto: Bunge jumpee de escadas caracol – sem corda.

Na segunda vez, a viagem foi ainda mais radical: direta, sem escalas. Desta vez nem latiu, grunhiu, nem nada... só ouvi a pancada contra o chão. Saiu caminhando meio torta, como zonza, meio assustada. Assustado também, achei, mais uma vez, que era o fim da lenda, mas era na verdade só a oportunidade para mais um milagre. Sim, Upi também ajudou a renovar minha fé: percebi que Deus protege mesmo as crianças, os bêbados... e as Upis.

Ou seja: poder-se-ia dizer que estávamos mesmo no lucro... mas, todos sabem que isso não conforta ninguém, ao menos não tão cedo (assim como não, não conforta, por mais sincero e verdadeiro que possa ser, aquele papinho clichê de que “descansou”, "já estava velhinha" - nós já sabemos disso, não precisa dizer: convivemos 15 anos com ela -, “estava sofrendo”, etc; muito obrigado, mas pense em algo mais criativo para dizer – gostei de um “isso devia ser proibido” – ou não diga nada além de um “é...é foda mesmo!”) muito menos antes da coisa acontecer, e assim a luta foi árdua e, nos últimos tempos, enquanto paradoxalmente líamos incrédulos notícias sobre gente maltratando, abandonando no mato ou jogando seus cachorros pela janela do carro, empregávamos toda nossa energia e cuidados, sacrificando às vezes sono, passeios, diversão e finanças por ela, e puxávamos de um lado, enquanto a indesejada das gentes – e dos bichos – puxava do outro, e não desistimos até o fim, que dia desses chegou, porém, sem cirurgias, sem quedas, sem aus – ou, ao menos, com mais ais do que aus – , de mansinho, pra nos poupar ao menos da duplicação do drama.

De qualquer maneira, como costumo dizer, as perdas pelo caminho de amigos, pessoas próximas, de entes queridos em geral, acabam por desmontar momentaneamente aquela espécie de “lego interior” que nos constitui.

Depois, pouco a pouco, acabamos remontando-o, juntando os pedaços, mas, ainda assim, sempre algo parece restar meio torto, a estrutura não ser mais a mesma.

É claro, há determinantes espaços vazios: faltam peças.

Bem, acabamos então de perder por aí mais uma pecinha, que talvez não fosse tão visível quanto outras na estrutura, mas que certamente vai fazer falta para o encaixe final desse negócio todo que nãoseibemcomofuncionasealguémaísabeporfavormeexplique.  
                                                                                                             
E por falar em encaixe final, um dia, daqui uns 354 anos, quando me for pros tais pagos celestiais, imagino ser recebido no portão véio lá de cima certamente antes de mais nada pelo sorrisão da vó dona Helena; mas também conto, ao mesmo tempo, com aquela pequena criatura preta pulando nas minhas pernas, ou, que se danem todas as igrejas e religiões com suas teorias furadas sobre almas e suas regras seletivas, mas não será de fato o Paraíso.

Procuro, então, imaginá-la lá, saltitante – quem sabe ao lado do Alaor Malaquias – esbaldando-se na doce rotina de um mar de lixeiras, posicionadas sobre fofas nuvens até onde a vista alcança lá no horizonte, a serem reviradas infinitamente sem perturbação, sem vetos, sem “UPIIIIIIIIIIIII!! SAI DAÍ!!!”... ou simplesmente, bem acomodadinha lá, enrolada em torno de si mesma como de costume, numa das suas eternas sonecas.

Mas a verdade é que ainda é estranho perceber o vazio embaixo da mesa de passar roupa e, ao sair de casa, às vezes ainda me esqueço e continuo deixando a luz da cozinha acesa para ela.


Pois, no fundo mesmo, ainda temos uma forte suspeita de que tudo não passe de só mais um truque da Upi.