Em mais uma participação especial no "De Letra", temos a honra de apresentar esta mordaz crônica nos enviada pela amiga e ilustre escritora, integrante da Academia Santa-Mariense de Letras, Celina Fleig Mayer:
O casamento é uma espécie de
sociedade “mista” em que seus componentes precisam fazer concessões... Quando
as coisas – essa palavrinha é muito abrangente, então diremos, quando a relação
não vai muito bem, é preciso marcar uma reunião. Geralmente as pessoas chamam
isso de “discutir a relação”, mas não é bem assim, até porque já começar com
discussão pode levar a rupturas. Reunião é melhor, e ela, para um casal, pode
surgir “do nada”, de uma paisagem, de um gramado cheio de orvalho, qualquer
acontecimento. Aliás, fatos novos sempre ensejam uma “reunião”, sejam eles
proporcionados por amigos, parentes ou entre o casal. Nasceu o filho, a mulher
anda tresnoitada e resmungona? Reunião presidida pelo excelentíssimo “sócio”
que está de cabeça fria. E, especialmente, deve se mostrar cheio de compreensão
e amor para dar. Isso rende juros e “correção” de comportamento.
Dia
desses recebi um emeil de um amigo que dizia nos invejar, marido e eu, porque
íamos para a praia, por uns dez dias, quase mensalmente. Menos, lógico,
naqueles meses bem frios, porque os pisos
dos apartamentos de praia dão uma sensação térmica além da realidade. Aí
ficamos aqui sobre o piso de madeira, aconchegados junto a lareira. Mas,
voltando à “santa inveja” do amigo, que ele é uma pessoa muito legal, se
explicava que a Madalena dele não gostava de praia. Desde o começo dos tempos, isto é, da longa
união de mais de 30 anos. Faltou um acordo inicial para resolver essa pendenga,tipo:
“Como assim, Madá? Que é que tem de ruim na praia? Vai ver que nunca gostaste
por causa da companhia, vindo comigo vai ser diferente. Prometo! A gente fica
lá, longe desse calorão, guarda-sol armado
junto ao mar, aquela brisa”...Acredito que agora, já é um tanto tarde, a
mulher não terá vontade de exibir curvas
passadas e perdidas, por pior que seja o verão na sua cidade. Não vai se deixar
convencer. Essa reunião nem deve acontecer mais, por falta de quorum...
Tão acostumada
ela a ser do contra que, na ocasião de comemorarem com os ex-colegas do marido
o aniversário de 35 anos de formatura da Faculdade, onde ele estudou, o cara
chegou sem sua Madalena. Todo mundo compareceu acompanhado da antiga ou da
atual consorte. E aí? Perguntavam. Estás viúvo? Ele explicou que a Madá não
gostava de viajar...
Constatei,
então, o quanto um casamento pode amofinar uma pessoa, abafar até, se ela não
tenta um acordo em tempo hábil, bem no início das primeiras “manifestações”
contrárias da outra parte. Esse amigo devia vir informando suas vontades,
negociando suas preferências para caberem nos contras da parte da mulher.
Cedendo aqui, avançando ali. Fico imaginando como deve ser a “função” de mesa e
cama, (ou o inverso), desse casal. Ele amanhece “todo-todo”, e ela vai ficando
uma “arara”, só repetindo: “para com isso, homem!” No mínimo, a Madalena é
daquelas mulheres que sofre de dor de cabeça persistente...
Um
autor, numa crônica inspirada, escreveu uma frase genial: “Os casamentos longos
acontecem muito mais pelos recuos do que pelos avanços...” Pelo jeito, a mulher
do meu amigo tem se aproveitado muito dos recuos dele. E, enquanto os dois vêm
avançando em idade, ela vai aumentando seu território. Não sei o que é que vai sobrar, no fim de
contas, para o pobre...
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